COMUNICAÇÃO

1º Anuário Soteropolitano da Prática Penal da Defensoria Pública é apresentado

18/03/2015 15:21 | Por

Principais avaliações do estudo foram apontadas pelo diretor da Esdep, Daniel Nicory à comunidade defensorial e à imprensa


As principais constatações do 1º Anuário Soteropolitano da Prática Penal foram apresentadas na tarde desta quarta-feira, (25), na sede da Defensoria Pública, em Sussuarana. O estudo produzido pelo Observatório da Prática Penal e coordenado pelo diretor da Esdep, Daniel Nicory, analisou 1.573 autos de prisões em flagrante, ocorridas em 2011, bem como os desdobramentos dos casos até o final do ano passado.

Divididas entre as varas de tóxicos, criminais e violência doméstica contra a mulher, as persecuções penais foram analisadas por uma equipe formada por estudantes pesquisadores que debruçaram-se sobre aspectos como o tempo médio de prisão antes das condenações, reincidência criminal, tipo de delito cometido, penas aplicadas, tempo médio para a sentença judicial, aplicação de penas alternativas, entre outras questões relativas ao preso não sentenciado, ou seja, aquele que espera o julgamento do seu caso por um juiz.

Para Daniel Nicory, algumas constatações revelaram situações já conhecidas do sistema penal em Salvador, como o tempo da custódia de presos antes das condenações. Em média, segundo o estudo, apenas 43,93% dos presos foram julgados, embora os resultados entre as varas pesquisadas sejam bastante diferentes entre si. Enquanto a vara de Tóxicos apresenta um grau de 63,89% de conclusão nas persecuções penais, na Vara de Violência Doméstica, esse número chega a apenas 11,97%.

CONDENAÇÕES

No quesito condenações, o estudo apontou que em média, ¼ das pessoas presas em flagrante, ao final do processo, foram absolvidas. O dado vai de encontro à ideia da certeza de culpabilidade nesses casos. "Verificamos que, na Vara de Tóxicos, por exemplo, há uma grande quantidade de casos que foram tratados como tráfico de drogas mas, ao final, verificou-se a desclassificação para um crime mais leve. Isso porque a legislação que contempla todas as leis antidrogas não consegue fazer uma distinção clara entre a conduta do traficante e a do usuário, o que é um problema porque, se compararmos a pena para este tipo de crime com a pena para um homicídio, muitas vezes, o rigor imposto ao tráfico (por ser crime hediondo), supera os crimes cometidos contra a vida", sentenciou.

Nicory chamou atenção ainda para a quantidade de drogas apreendidas individualmente, e que motivaram a prisão por crime de tráfico. Em 67,02% dos casos ligados ao crack, essa quantidade foi de até 10 gramas. Para a maconha, 20% das apreensões referiram-se a quantidades que variaram de 100 a 200g. Das pessoas presas por portarem cocaína, o maior percentual - 24,07% possuíam de 5,01 a 10g. Ainda de acordo com pesquisa da USP, mencionada durante a apresentação, 91% dos presos em flagrante por tráfico de drogas são condenados.

PRENDE-SE MUITO E PRENDE-SE MAL

Outra avaliação do estudo aponta o emprego excessivo de prisões privativas de liberdade antes das condenações. Em média, os presos considerados inocentes passaram 109 dias custodiados antes de serem absolvidos. Isso mostra, segundo o pesquisador, que o sistema penal em Salvador superlota prisões provisórias antes mesmo de o sentenciado ser condenado. A média de 33% de tempo da prisão cautelar não só é bastante superior aos 16,67% de pena cumprida necessários para a primeira progressão, patamar superado inclusive no subgrupo dos condenados sem nenhum registro prévio (21%), como equivale exatamente à fração de pena necessária para a obtenção do livramento condicional.

VARA DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA

Dos 142 processos avaliados desde 2011, na área de violência doméstica, apenas 12% foram julgados e nenhum dos casos obteve condenação. Segundo a pesquisa, por diversos fatores, a Vara é a que apresenta os piores resultados se comparada às outras áreas criminais. "Na Vara de Violência Doméstica, além de a taxa de resolução ser a mais baixa e a última fase em que se encontravam as persecuções em andamento ser a mais precoce de todas, as poucas persecuções concluídas se dão, majoritariamente, pelo arquivamento do inquérito policial, já que a duração média da persecução (396 dias) é muito maior do que a do processo penal (252 dias), indicando, por fim, que as raras persecuções que chegam à denúncia, com duração excessiva da fase pré-processual (168 dias), são encerradas antes da fase instrutória", aponta o estudo.

Para Daniel Nicory, o Anuário não tem o objetivo de apontar culpados ou criticar o trabalho das Instituições, mas, ao contrário, lançar luz sobre problemas intrínsecos ao sistema penal e que precisam ser corrigidos, a partir de políticas públicas e legislações eficazes. "Com a divulgação dos resultados do Observatório, a Escola espera cumprir de forma mais adequada as suas funções institucionais de produzir e divulgar conhecimento científico em Direito, contribuindo para o debate público, com dados coletados e tratados de forma rigorosa e imparcial, capazes de embasar a atuação da própria Defensoria Pública e de outras instituições estatais ou da sociedade civil".

DESTAQUE

Presente durante a apresentação, a defensora pública geral, Vitória Beltrão Bandeira, fez questão de parabenizar a Escola Superior da Defensoria pelo trabalho realizado ao longo dos dois últimos anos. Segundo Vitória, os estudos produzidos pela Esdep, capitaneados pelo defensor púbico Daniel Nicory colocaram a Escola baiana em um patamar destacado entre as Esdeps e nos cenários acadêmicos nacional e internacional. "Quero deixar aqui os meus parabéns à excelente atuação da Escola, que se tornou uma referência do ponto de vista científico para a coleta de dados e estudos que vão embasar a formulação de políticas públicas eficazes. À Daniel Nicory, os meus parabéns por ter conseguido, através do trabalho realizado e dos estudos da Escola, mostrar que muito do que se fala às vezes não corresponde à realidade fática".