COMUNICAÇÃO
Após condenação injusta, assistido da Defensoria da Bahia é absolvido pelo STJ por ter domicílio violado pela polícia
Com base na Constituição, que considera a casa "asilo inviolável", Instituição recorreu ao STJ e habeas corpus foi concedido ao assistido da Bahia. Todas as provas do processo foram anuladas
Sabe aquele princípio constitucional em que o acusado deve ser considerado inocente até que se esgote todas as instâncias de julgamento? Pois é. Ele vale para o rico e para o pobre. Seguindo este princípio, a Defensoria Pública da Bahia – DPE/BA não mede esforços e recorre, quando há fundamento legal, até a última instância para garantir a defesa dos direitos da população.
Na quinta-feira, 12, o Superior Tribunal de Justiça – STJ, em Brasília, deferiu o pedido da Defensoria e concedeu habeas corpus ao assistido Paulo*, condenado por tráfico de drogas em 2019 em primeira e segunda instâncias, após policiais terem entrado em sua residência sem autorização ou mandado judicial e apreendido cocaína.
Como o Recurso de Apelação interposto pela Defensoria foi negado pelo Tribunal de Justiça do Estado da Bahia – TJBA, a Defensoria não desistiu de garantir o direito do assistido e recorreu ao STJ com a tese de que o ingresso no domicílio foi ilegal e, com isso, as provas colhidas não eram válidas, já que houve uma violação da garantia prevista na Constituição.
“A Constituição Federal, em seu artigo 5º, inciso XI, determina que ‘a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial’. Foi com base nesta garantia constitucional que, após a negativa da apelação no Tribunal Estadual, recorremos ao STJ”, explicou o defensor público Marcelo Borges de Freitas, que atua na Instância Superior da Defensoria. “Impetramos o pedido de habeas corpus e garantimos a absolvição do assistido em virtude da nulidade de todas as provas produzidas a partir do ingresso irregular na residência, no momento da suposta prisão em flagrante”, completou.
Bairros populares x bairros de classe média
De acordo com o que consta nos autos, os policiais entraram na residência de Paulo*, em um dos bairros da Cidade Baixa, em Salvador, após uma denúncia anônima. Mas, de acordo com o defensor Marcelo Borges, a denúncia anônima acerca da prática de crime, por si só, não pode ser considerada razão suficiente para ingresso em nenhum domicílio.
“É preciso existir uma suspeita séria e fundada da prática de delito para que ocorra a intervenção policial, seja para prender alguém em flagrante, seja para o Poder Judiciário determinar o cumprimento de mandado de busca e apreensão ou de prisão, com a quebra da inviolabilidade do domicílio”, afirmou o defensor.
Além de não ter existido uma suspeita fundada e uma investigação prévia, uma outra questão que chama atenção no caso de Paulo* é a região onde ele mora. Para a Defensoria, fica no ar a pergunta: será que se ele morasse em um bairro de classe média da capital essa quebra da inviolabilidade do domicílio também aconteceria?
“A invasão não se justifica em lugar nenhum: a casa de uma pessoa pobre tem que ser tratada da mesma maneira que a casa de uma pessoa rica. Assim como não se pode entrar sem mandado judicial em um apartamento nos chamados bairros nobres da cidade, não se pode entrar nos bairros populares”, lembrou o defensor público geral, Rafson Saraiva Ximenes, ao saber da decisão favorável ao assistido da Defensoria.
E quando o assunto é promover a educação em direitos e orientar a população sobre a abordagem policial a Defensoria entende bem do assunto: há um mês, a Instituição lançou a nova edição da cartilha de “O que você precisa saber sobre abordagem policial”, que traz, entre os seus capítulos, as explicações sobre a abordagem em casa e a garantia da inviolabilidade do domicílio.
* nome fictício para preservar a identidade do assistido