COMUNICAÇÃO

Debates da Roda de Diálogo não se limitaram à guerra contra as drogas

30/08/2015 13:27 | Por Vanda Amorim - DRT 1339/PE e Luciana Costa - DRT 4091/BA

Vítimas de conflitos fundiários fizeram relatos dos problemas vividos em suas comunidades

A sociedade civil esteve reunida na Escola Superior da Defensoria Pública da Bahia, nesse sábado, 29, para discutir as políticas de drogas e a criminalização da juventude negra na Bahia. Promovido pela Escola Superior e Ouvidoria Geral da Defensoria Pública da Bahia, com o título "Na guerra às Drogas, o inimigo é outro. A Política de (In)Segurança Pública da Bahia Preta e o Racismo", a Roda de Diálogo teve a participação de parlamentares e especialistas na área. O debate não ficou limitado à questão das drogas. Duas comunidades buscaram apoio para resolução de conflitos fundiários que enfrentam.

Além das observações feitas pelos palestrantes (veja aqui) e das propostas retiradas na Roda de Diálogo (confira aqui), debatedores convidados apontaram para a necessidade de descriminalização do uso de substâncias psicoativas e para a não redução da maioridade penal. A defensora pública Fabiana Almeida, que atua na área de Direitos Humanos e coordena a Equipe Pop Rua no atendimento de pessoas em situação de rua e que fazem uso de substâncias psicoativas, criticou o fato de mulheres que vivem na rua e são usuárias de drogas terem seus filhos retirados do seu convívio, enquanto o mesmo não acontece com outras mulheres que também usam drogas como o crack mas moram em casas ou apartamentos em bairros nobres.

Fundador e ex-coordenador do Centro de Estudos e Terapia de Abuso de Drogas – Cetad, professor Antonio Nery, criticou a decisão da Secretaria de Saúde do Estado em fechar o Ponto de Encontro, uma unidade de atenção a usuários de substâncias psicoativas no Centro Histórico de Salvador – Pelourinho , viabilizada em 2012 através de parceria entre Voluntárias Sociais da Bahia, Governo do Estado, Tribunal de Justiça do Estado da Bahia e o Centro de Terapia do Abuso de Drogas – Cetad (Leia aqui). O programa vinha sendo desenvolvido pelo Cetad e a Sesab era responsável pela gestão e manutenção do equipamento. "As pessoas conviviam em harmonia, respeitando as diferenças. Hoje as pessoas estão usando crack em um esgoto insuportavelmente fétido, como forma de proteção á morte pela polícia", denunciou.

O professor Antonio Nery fez com que todos os que estavam sentados nas cadeiras saíssem da sua zona de conforto e trocassem de lugar com os que estavam no chão. Todos atenderam ao convite, inclusive o defensor público geral, que sentou no chão do auditório lotado.

Samuel Vida, professor de Direito que integra o programa Direito e Relações Raciais da faculdade de Direito da UFBA e o Afrogabinete de Articulação Institucional e Jurídica – Aganju, questionou qual seria a dificuldade das autoridades entenderam a ligação entre o combate às drogas e o racismo, quando os casos são tão óbvios. Marcos Cândido, cofundador e coordenador de Arte e Educação do projeto Axé, defendeu que o conhecimento sobre direitos sejam levados até as escolas públicas. Outras lideranças, como Thiago Azeviche, do Coletivo Palmares e membro do Conselho Estadual da Juventude, e a professora Walquíria Lima, também abordaram o quadro de racismo. A professora relatou o caso dos 20 estudantes expulsos do IFBA – campus de Camaçari, após manifestações.

QUESTÕES FUNDIÁRIAS

Dois momentos na Roda de Conversa registram denúncias de conflitos fundiários. Em um, quatro garotas entre 11 e 14 anos foram pedir ajuda para que seja encontrada uma solução para os problemas que enfrentam. Elas relataram casos de agressão policial, e até morte, na comunidade Guerreira Zeferina, também conhecida como Cidade de Plástico, na cidade baixa. Segundo as meninas, há um movimento para que as mais de 200 pessoas que moram ali sejam retiradas para a implantação da orla (Saiba mais ).

Rosimeire dos Santos, do Quilombo Rio dos Macacos, fez um desabafo e uma comovente súplica por ajuda para o problema que enfrentam na comunidade, que precisa passar por dentro da Vila da Marinha para se deslocar para trabalho, escola, médico ou qualquer outra atividade externa. Ela esteve na semana passada na Defensoria Pública (Leia aqui) e pede uma audiência com o Ministro da Defesa, Jaques Wagner, para pedir a liberação de abertura de uma estrada independente de acesso ao quilombo.

IMPRESSÕES DO PÚBLICO

" O debate superou minhas expectativas. Poucos tem coragem de promover um evento como esse. A população negra sofre todo tipo de discriminação e ainda tem gente com coragem pra dizer que não existe racismo." – Suely Barbosa – estudante de Direito (28 anos)

"Vim acompanhar meu filho e o tema acabou me prendendo a atenção. Foi um assunto interessante e não podemos aceitar o que acontece hoje no Brasil. Parabéns, Defensoria!" – Carlos Santana – servidor público (56 anos)

" Sou mulher, sou negra e sofro discriminação todo dia. Nosso povo sofre sem acesso á educação, à saúde de qualidade… Até quando iremos silenciar diante da distinção de raça? É inaceitável! Temos que discutir, sim. Temos que lutar pela igualdade de direitos." – Walmara da Conceição (31 anos)

" Sou admirador de Jean (Wyllys) e a oportunidade que a Defensoria proporcionou foi valiosa. É um cara que incomoda muita gente por sua verdade." – Vitor D´Affonso – sociólogo (23 anos)

" Foi uma discussão rica. É importante lutar por uma sociedade mais igual. Já utilizei os serviços da Defensoria e o que aconteceu aqui hoje mostrou que a instituição está crescente na luta pelos direitos da população baiana." – Magali Alves – assistente social (22 anos)