COMUNICAÇÃO

Defensoria emite nota pública sobre suposto caso de racismo

31/08/2020 21:26 | Por Vanda Amorim DRT/PE 1339

Instituição afirma que a luta contra o racismo é um princípio básico da Defensoria Pública, assim como também o são a ampla defesa e a presunção de inocência.

NOTA PÚBLICA 

A Defensoria Pública do Estado da Bahia vem elucidar informações publicadas na coluna Painel, da Folha de São Paulo no domingo, 30 de agosto.

A coluna trata de um caso no qual, no primeiro semestre de 2019, a Defensoria Pública obteve decisão favorável a um estudante negro, para que ele ingressasse em uma Universidade Pública. Em julho passado, mais de um ano depois, a DPE/BA foi procurada pela Educafro, organização não governamental com sede em São Paulo, que relatava suposta prática de racismo na instituição e exigia que ela adotasse práticas internas para evitar a discriminação. Como a mensagem não apresentava todas as informações necessárias para apuração do possível caso de racismo, o Gabinete da Defensoria Pública Geral solicitou o encaminhamento de mais detalhes, colocando-se à disposição da Educafro. Relatou ainda uma série de medidas de combate à intolerância e agradeceu pelas sugestões de melhoria. Nenhuma resposta recebeu da organização até o momento.

Na sexta-feira, 21 de agosto, a Defensoria Pública foi procurada por uma jornalista da Folha de São Paulo, falando sobre acusações oriundas da Educafro e do estudante. Neste contato recebemos através do Jornal informações solicitadas à Educafro. No sábado, 22, informou ao jornal que faria a apuração e respondeu os seus questionamentos. Apresentou também relatório sobre uma série de medidas adotadas pela Defensoria Pública do Estado da Bahia com o objetivo de promover a igualdade racial e enfrentar o racismo estrutural. Entre eles a criação de um Grupo de Trabalho pela Igualdade Racial e a promoção de cursos pela Escola Superior, que já acontecem, tanto para defensores quanto para servidores.

A Defensoria Pública identificou que a acusação se referia à ação mencionada em que a sua atuação foi exitosa. A primeira defensora que atendeu o assistido não viu viabilidade jurídica no pedido e recusou o atendimento. Na ocasião o argumento apresentado para obtenção da vaga no ensino superior seria a existência de um candidato que se declarara como negro, mas que seria branco, sendo que o único critério previsto no edital era a auto-declaração. Porém, na Defensoria Pública, a recusa de atendimento precisa ser aceita pela Administração Superior. O órgão superior decidiu que a causa era viável e determinou que outro defensor fizesse o atendimento.

No segundo atendimento, o assistido trouxe fatos novos, que levaram à definição de nova estratégia processual, considerada mais segura para obtenção do resultado pretendido. Após o manejo da ação, a Defensoria peticionou seis vezes, pedindo celeridade no julgamento. O resultado já foi antecipado: o jovem e a defensoria venceram, ele se tornou universitário. Pode parecer óbvio, mas parece importante destacar que, na maioria das vezes, as demandas individuais buscam resultados individuais. É bom quando ganham dimensão coletiva, mas nem sempre isso é possível ou adequado.

Porém, para a nossa surpresa, a nota publicada no jornal impresso ignorou todas as informações prestadas. Resumiu as informações a uma frase: “A Defensoria da Bahia afirma que soube do caso apenas após a carta de David e rejeitou que este seja um episódio de racismo”. Nem essa frase é verdadeira, pois a Defensoria não emitiu juízo de valor sobre a acusação. Nas informações encaminhadas à Folha de São Paulo, o defensor público geral destacou que o fato inegável de existir racismo estrutural em toda a sociedade não significa necessariamente que, no caso concreto, houve prática de racismo. Apontou que isso precisaria ser apurado, assegurando que, no âmbito da instituição, qualquer ato de racismo devidamente comprovado deve ser punido.

Na coluna é afirmado que “Após a primeira recusa da Defensoria, Janedson procurou a Ouvidoria, que designou um novo defensor. Ele venceu a causa, mas não com o argumento de subversão das cotas. O outro aluno desistiu do curso”. Isto apesar de a Defensoria ter informado que a mudança da tese seguiu solicitação do próprio assistido. Vale elucidar que a Ouvidoria da Defensoria Pública é externa, dirigida por representantes da sociedade civil. Na Bahia, a direção desde 2009, quando foi criada, está a cargo de grandes lideranças da luta antirracista. Ela não tem qualquer poder de “designar outro defensor”. No caso em tela, a Ouvidoria optou por atuar junto à própria Universidade. Caso houvesse identificado de imediato indícios de prática de racismo, teria encaminhado a situação à Corregedoria ou à Defensoria Pública Geral.

Após contato da Assessoria de Comunicação, no próprio domingo, a versão digital foi modificada, para incluir algumas das informações prestadas. A primeira versão on-line, porém, foi reproduzida por outros sites sem a alteração e sem buscar a versão da Defensoria. A versão impressa do jornal evidentemente não foi alterada. A manchete on-line chega a falar em negligência, em um caso no qual foi obtido sucesso.

Ressaltamos, mais uma vez, que a Defensoria da Bahia, institucionalmente, é favorável ao sistema de cotas com entrevista de verificação e inclusive, aplica o sistema desde 2016, após resolução proposta pelo atual defensor-geral.

Por fim, reafirmamos, como fizemos ao nos dirigir à Educafro e à Folha, que o racismo é um dos problemas mais graves do Brasil, que estruturam negativamente o nosso modo de pensar e de ler o mundo. A existência do racismo estrutural é inegável, deve ser enfrentado e não exime ninguém de responsabilização individual. A responsabilização individual, para ser justa, precisa ser precedida de investigação, com a oitiva também de quem é acusado. A luta contra o racismo é um princípio básico da Defensoria Pública, assim como também o são a ampla defesa e a presunção de inocência.

Salvador, 31 de agosto de 2020

Defensoria Pública do Estado da Bahia