COMUNICAÇÃO

Defensoria inicia ações contra revista vexatória em presídios

11/02/2014 18:45 | Por

Como há muito se sabe, os presídios utilizam métodos vexatórios ao proceder à revista íntima em pessoas, geralmente familiares dos presos, que ingressam na unidade prisional com o fim de visitar alguém conhecido ou familiar que ali se encontra encarcerado. Como se já não bastasse a angústia gerada por estar num local indesejado, os visitantes ainda têm de enfrentar os métodos de revista íntima, que ferem de morte os direitos fundamentais do indivíduo, como o da intimidade, uma vez que são obrigados a se despir perante os agentes penitenciários.

Embora seja a revista um método que visa coibir o ingresso de armas, drogas ou quaisquer objetos na prisão, para os defensores públicos da Subcoordenação da Especializada Criminal e Execução Penal esta não pode ser realizada de maneira tão cruel e desumana, submetendo as pessoas a esse tipo de humilhação. Mesmo assim, apesar de todas as formas de protestos das pessoas que têm de se submeter a tal constrangimento e dos questionamentos institucionais, a prática permanece inalterada.

"Verifica-se que as pessoas até então consideradas livres, pois ingressam nas unidades prisionais apenas com o único intuito de visitar, passam a sofrer o que se pode chamar de pena, que, muitas vezes, torna-se tão severa quanto a pena a ser cumprida por quem se encontra efetivamente encarcerado", comenta o defensor Pedro Paulo Bahia, responsável pelo trabalho de visita aos presídios, a fim de subsidiar futuras iniciativas da Defensoria Pública.

Além disso, como informam os defensores da Especializada, a exemplo do Processo Administrativo Disciplinar nº 001 da UED, vistorias sistemáticas são promovidas no complexo, onde se fiscaliza, apreende e reprime a posse e utilização de materiais proibidos, com severas punições para o interno e determinação interna de suspensão do direito de visita dos que portem material proibido.

"Além da violação aos direitos fundamentais de pessoas comuns, sem contas a prestar com a justiça, resta patente a extrema violação ao princípio constitucional da pessoalidade, também conhecido como Princípio da Intranscendência da Pena, previsto no artigo 5º, inciso XLV. Por conta disso, a pena a ser cumprida pelo condenado vincula também o seu familiar, no momento em que são submetidos aos procedimentos inconstitucionais das revistas íntimas", comenta o subcoordenador da Especializada, Alan Roque de Araújo.

"Eles alegam, ainda, a fragilidade visível na contenção da exposição a que ficam submetidas as pessoas custodiadas, tanto em delegacias de polícia quanto em unidades penitenciárias. E chamam a atenção para a forma como os meios de comunicação de massa tratam pessoas supostamente criminosas. Eles promovem, de forma absurda e cotidiana, a impossibilidade da presunção de inocência. E estendem, de forma pública e nefasta, os efeitos da pena (prisão) à família do réu", prossegue o defensor.

"A manutenção deste procedimento invasivo e indigno, especialmente para visitantes do sexo feminino - mães e filhas dos internos -, acaba por afastá-los de seus familiares, que a constituição elegeu como base da sociedade, prejudicando em definitivo sua ressocialização - objetivo da pena. Por outro lado, certo é que este cidadão retornará ao convívio da sociedade, esta reflexão é necessária, pois o sistema penal apenas lhe apresentou o seu viés punitivo e uma demasiada privação, tanto material quanto e emocional, justamente neste momento extremo de carência", avalia o defensor Pedro Paulo Bahia.

Mesmo havendo uma regulamentação para o ingresso e visita dos familiares nos estabelecimentos penais, que determina que a revista não deve expor a pessoa a constrangimento, não é esta a realidade verificada nas unidades prisionais do país, e muito menos na Bahia. Ademais, embora a revista vexatória tenha se naturalizado como procedimento adotado como praxe nos presídios brasileiros, tal fato não evita a entrada de objetos proibidos (armas, celulares e drogas) que continuam, de forma irregular e ilegal, suprindo a demanda dos internos e provocando a ocorrência de mais delitos, dentro e fora das unidades.

Para ilustrar o absurdo da situação, ss defensores citam um estudo, realizado por Thaís Lemos Duarte, sobre procedimentos de revistas íntimas no Sistema Penitenciário do Estado do Rio de Janeiro. A autora identificou que durante revistas íntimas as mulheres devem se despir, ficando nuas diante das agentes penitenciárias.

"Via de regra, elas devem abaixar e levantar três vezes, primeiro de frente e depois de costas. Em algumas unidades as mulheres precisam ficar despidas, virar de costas, abaixar o tronco e olhar a agente entre as pernas. Em outras, elas precisam ficar com o tronco para baixo, abrir suas partes íntimas com as mãos e soprar uma garrafa plástica", relata o documento.

"Neste caso, o Estado, através dos seus agentes, lança por terra o princípio da intranscendência da pena, demonstrando que a vagueza com que os regulamentos e/ou estatutos penitenciários disciplinam a realização da revista íntima ao condicioná-la ao não constrangimento do revistado. Isto cria uma margem inconstitucional de interpretação acerca do que seja ou não constranger um familiar e, mais que isso, fazê-lo sofrer de forma indireta as consequências da imposição de uma pena privativa de liberdade", analisa o defensor Nelson Cortês.

Inicialmente, a Especializada pretende trazer essa situação para o debate público. Manter as visitas aos presídios, promover audiências públicas, ampliar a divulgação dos fatos nos meios de comunicação e mobilizar a sociedade em torno dessa questão, são ações que serão desenvolvidas nos próximos meses pela Defensoria Pública. Ações judiciais também estão no rol das estratégias que poderão ser adotadas a fim de impedir, de uma vez por todas, esse procedimento, considerado, em todas as suas formas, como abusivo, totalmente contrário ao espírito da lei, no Estado Democrático de Direito, e de negação aos direitos humanos.