COMUNICAÇÃO
Defensoria lança cartilha sobre abordagem policial com palestra sobre racismo estrutural
Cartilha tem linguagem acessível e direta e busca apontar garantias e orientar condutas para estimular nova relação entre agentes de segurança e cidadãos
“O que você precisa saber sobre abordagem policial” é o título da cartilha lançada pela Defensoria Pública do Estado da Bahia – DPE/BA nesta quinta-feira, 14, em evento que contou grande presença de policias militares em formação e representantes de movimentos negros.
De maneira direta e acessível, a cartilha aborda uma variedade de assuntos como: identificação policial, revista pessoal, uso de algemas, busca domiciliar, realização de exame de corpo delito, devolução de pertences, abuso de autoridade, audiência de custódia, denúncia à violência arbitrária, entre outros temas.
Prestigiando o momento, o defensor público geral da Bahia, Rafson Saraiva Ximenes, discorreu sobre a segurança como uma questão que tem vínculos com questões sociais e culturais e da necessidade do combate repressivo buscar sempre se ater aos pressupostos legais, não agindo de forma ilegal para supostamente promover justiça.
“Todo mundo deseja ter segurança, mas sem sofrer violência e abuso. Existem excessos e alguns agentes que deveriam assegurar a paz, por equívoco, por insegurança, terminam sendo eles próprios autores de agressão. A polícia deve fazer seu trabalho, porém este trabalho não pode gerar um dano ao cidadão. A cartilha é instrumento de educação em direitos, para que a população e os agentes saibam de suas garantias e deveres”, assinalou Rafson Ximenes.
JUVENTUDE NEGRA
Construída com muitas mãos, a cartilha contou com a contribuição de diversas instâncias da Defensoria e colaborações externas, sendo coordenada pela Especializada dos Direitos Humanos da Defensoria. Para a defensora pública e coordenadora da Especializada, Lívia Almeida, a publicação tem também como contexto o aumento dos casos de violência contra a juventude negra.
“O Atlas da Violência de 2019 demonstrou que a mortandade da juventude negra brasileira tem aumentado. Infelizmente é uma realidade nacional: a grande maioria das pessoas abordadas, vítimas de letalidade e encarceradas, por conta de um racismo estrutural, são negras. Com a cartilha a gente procura estimular uma nova relação entre agentes de segurança e cidadãos. A abordagem não pode se basear em estereótipos sociais”, sustentou Lívia Almeida.
O Coronel Valter Meneses, diretor de Comunicação Social da Polícia Militar da Bahia, esteve presente no evento – representando o comandante geral da Polícia Militar, Anselmo Brandão – e comentou a importância da iniciativa da Defensoria.
“A Defensoria presta um serviço importante com a publicação desta cartilha. Vamos promover na corporação um debate do valor que tem este trabalho. Nós temos hoje núcleos que impulsionam o policial a entender que ele deve tratar todos, brancos, negros, chineses, qualquer ser humano, de modo apropriado. Nossa Corregedoria funciona e tem se empenhado em combater as atitudes ilegais que os policias venham a cometer”, afirmou Valter Meneses.
O evento contou também com a participação dos coordenadores da Especializada Criminal e de Execução Penal, Fabíola Marguerita Pacheco e Maurício Saporito; com a diretora da Esdep, Soraia Ramos; e com o defensor público Bruno Moura.
RACISMO ESTRUTURAL
Sediado na Escola Superior da Defensoria, o lançamento da cartilha contou ainda com a palestra sobre “Racismo Estrutural”, ministrada pelo professor e advogado criminalista Vinicius de Assis Romão. Para Romão, a necessidade de se debater raça e racismo, numa perspectiva que ultrapasse o indivíduo, é fundamental para combater desigualdades estruturais que permeiam as lógicas das instituições.
“As instituições reproduzem o racismo que existe socialmente, independente de práticas conscientes ou não, isso gera desvantagens para determinados grupos populacionais e privilégios para outros. A construção dos estereótipos de quem são os suspeitos, os mecanismos no trato com estes, a destacada vulnerabilidade de ‘determinados corpos’ a sofrer violências e violações, tudo isto está marcado pela estrutura de desigualdade racial no Brasil. Neste contexto, ao debater a abordagem policial é preciso abordar o racismo estrutural como ferramenta de compreensão das práticas”, apontou Vinicius Romão.
Ainda para Vinicius Romão, a cartilha é necessária justamente porque existem grupos vulneráveis na sociedade que não acessam os seus direitos, já que se veem excluídos até mesmo do status de humanização. “É negado mesmo a estes grupos ou pessoas, um status que é até anterior ao de cidadania. Toda a questão destas desigualdades, no Brasil, está marcada pelo racismo”, acrescentou.
A cartilha pode ser conferida aqui.