COMUNICAÇÃO

Defensoria promove I Encontro Baiano de Diretos Humanos

18/10/2013 20:19 | Por

Foi aberto nesta quinta-feira, 17, o I Encontro Baiano de Defensores Públicos em Direitos Humanos. O evento acontece na Escola Superior da Defensoria Pública da Bahia (ESDEP), no Canela, e conta com a participação de defensores públicos palestrantes de outros estados. A iniciativa é da subcoordenação da Especializada de Defesa dos Direitos Humanos e tem por objetivo, além da discussão de temas ligados às suas áreas de atuação, a troca de experiências e de procedimentos adotados em ações bem sucedidas.

A abertura do evento contou com a presença do coordenador das Regionais da Capital, Wagner Almeida, do coordenador das Regionais do Interior, César Ulisses, da ouvidora geral, Tânia Palma, do diretor da ESDEP, Daniel Nicory, e da subcoordenadora da Especializada de Direitos Humanos, Bethânia Ferreira. Defensores públicos da capital e do interior, que atuam na área, também participaram do Encontro.

A programação foi dividida em painéis, com a presença de defensores de outros estados, convidados para expor experiências em suas áreas de atuação, como também trocar informações e debater questões importantes no que se refere aos procedimentos adotados pela Instituição.

Dois painéis foram realizados durante a manhã. O primeiro, "Prevenção, Mediação e Regularização Fundiária e Direito à Moradia", foi apresentado pela defensora pública Cryzthiane Andrade Linhares, que atua na Especializada de Direitos Humanos da Defensoria Pública de Minas Gerais, tendo como facilitadora a defensora Maíra Souza Calmon de Passos e como relator o defensor Alex Raposo dos Santos, ambos com atuação no Núcleo Fundiário da Especializada de Direitos Humanos da Defensoria da Bahia.

Primeiro painel - O primeiro painel visa discutir os conflitos fundiários urbanos surgidos de uma política excludente de ocupação e uso do solo nas cidades, assim como a garantia do direito à moradia digna e urbanização. Também analisa a atuação da Defensoria Pública na tutela dos direitos de coletividades ou comunidades nos conflitos gerados pelos empreendimentos públicos e privados, que envolvam famílias de baixa renda ou grupos vulneráveis.

Em sua exposição, ela traçou um quadro sobre as principais demandas nesta área, ressaltando o problema da garantia do direito à moradia, a questão das ocupações, a imposição da lógica dos interesses da especulação imobiliária e as relações políticas entre o poder público, os interesses privados, representados pelo mercado, e a população, principalmente a de baixa renda.

Apesar dos avanços conquistados na legislação, a defensora afirmou que há um verdadeiro embate político para fazer valer o efetivo direito à moradia. "Há muito preconceito com relação à população mais pobre, aos favelados. Esse é um dos principais obstáculos, porque as políticas habitacionais são concebidas para afastá-los cada vez mais para a periferia das cidades. Em Belo Horizonte, temos problemas gravíssimos nesta área", disse Cryzthiane.

Segundo a defensora a regularização fundiária deveria ser aplicada para melhorar a qualidade de vida das pessoas que habitam determinadas regiões da cidade. No entanto, o poder público, geralmente o município, não tem essa compreensão do problema. De acordo com sua análise, as prefeituras se tornaram um grande "balcão de negócios", atendendo, prioritariamente, aos interesses do mercado imobiliário, mais especificamente da especulação.

Dessa forma, áreas ocupadas por pessoas de baixa renda, mas que têm expressivo valor de mercado, são alvo das ações desse setor. "As ações de remoção dessas populações muitas vezes não estão amparadas em fatores técnicos, como áreas de risco, por exemplo, mas simplesmente em interesses do processo de expansão dos negócios imobiliários. Para nós é uma luta sem fim", afirmou.

Ela criticou o fato de que muitas vezes o poder público em vez de solucionar um problema técnico para a manutenção dos moradores no local onde criaram suas relações sociais e culturais, como é o caso de ocupações com mais de 20 anos, partem para uma política de remoção, deslocando centenas de famílias para locais, muitas vezes, sem infraestrutura compatível com a nova demanda.

Cryzthiane apontou vários pontos como referência para a ação da Defensoria Pública nas questões fundiárias, principalmente as urbanas. A demarcação urbanística, a legitimação da posse, o usucapião administrativo, além de vários outros instrumentos contidos na legislação pertinente, como também no Estatuto das Cidades, subsidiam procedimentos judiciais e ampliam a possiblidade de um processo de regularização fundiária bem sucedida.

"Aprendemos muito com a organização e ação política dos movimentos sociais. Temos buscado parcerias com instituições comprometidas coma justiça social. Mesmo assim, temos consciência das dificuldades no enfrentamento das questões fundiárias, principalmente pela influência do poder econômico. Através de ações civis públicas queremos garantir o direito à moradia prevista na Constituição Federal. No entanto, sabemos que não é uma batalha fácil de ser ganha", declarou a defensora.

Segundo painel - O segundo painel abordou o tema "Povos Tradicionais, Direitos Étnicos e Direitos Humanos". Seu objetivo foi analisar os direitos dos povos e comunidades tradicionais, em especial quilombolas e indígenas, positivados nas normas nacionais e internacionais, como discutir as suas formas de efetivação e proteção, bem como a participação da Defensoria Pública no processo. A mesa foi composta pelo palestrante convidado, Roberto Tadeu Vaz Curvo, da Defensoria Pública do Mato Grosso, a defensora Cristiane Barreto Nogueira, como facilitadora, e Felipe Silva Nova, relator. Os dois do quadro de defensores públicos da Bahia.

Depois de uma breve contextualização da questão histórica dos povos indígenas e quilombolas no Mato Grosso, o defensor enfocou questões legais, aspectos jurídicos e as relações de poder entre a justiça, os políticos e os proprietários de terras. Através da exibição de fotos e vídeos Roberto Tadeu apontou uma histórica situação de injustiça que se consolidou naquele estado.

"As terras, que inicialmente eram desses povos, foram tomadas por particulares, muitas vezes políticos e até pessoas importantes do Judiciário, que se tornaram fazendeiros, alguns com áreas tão extensas de terras que nem dá para acreditar. O uso da violência, de forma banal, uma polícia comprometida com os poderosos e uma justiça tendenciosa e parcial fazem do poder público um agente sem credibilidade. Por isso, no Mato Grosso, o papel da Defensoria é de vital importância para a garantia dos direitos dessa população", ressaltou o defensor.

Para Roberto Tadeu, a lei não é suficiente para fazer valer o direito dessas comunidades à posse da terra. A situação de grande parte dessas populações é de abandono e miséria. Deslocados de seus contextos originais, muitos não conseguem se adaptar à nova vida, geralmente em comunidades onde são vistos como "estranhos". O defensor citou uma série de situações que mostram como o poder econômico dita as regras do jogo.

"As fazendas de monocultura de soja e milho, que servem à cadeia produtiva do agronegócio, precisam cada vez mais de novas terras. É uma expansão que vai expulsando essas comunidades de seu verdadeiro habitat. Nesta briga há um processo de discriminação e preconceito, que parte tanto dos agentes públicos como da imprensa e da própria sociedade. Essas comunidades são vistas hoje como intrusas, gente sem valor", destacou.

O defensor abordou dentre várias questões importantes, as condições objetivas e subjetivas de determinação dos povos indígenas e comunidades tribais, principalmente no que diz respeito à tradição e aos costumes próprios. Enfatizou o fato de que, embora haja uma legislação no país que estabelece políticas especificas voltadas para esses povos, como também leis internacionais, que indicam procedimentos e posturas a serem adotados nessas questões. O grande problema, segundo ele, está na dificuldade de se fazer cumpri-las.