COMUNICAÇÃO

Familiares de vítimas da letalidade policial relatam luta por justiça no encontro de Segurança Pública

04/04/2022 15:22 | Por Ailton Sena DRT 5417/BA

O evento aconteceu nos dias 31 de março e 1º de abril na Escola Superior da Defensoria e marcou os 30 dias das mortes ocorridas na Gamboa.

A tarde do segundo dia do encontro Segurança Pública e Justiça Criminal [01/04], foi marcada pela dor e emoção de familiares de pessoas mortas pela violência policial. Em discursos embargados pelas lágrimas, eles/elas contaram as histórias dos parentes mortos e como têm vivido e lutado por justiça. O evento aconteceu 30 dias após a morte de três jovens durante uma ação da Polícia Militar na Gamboa, em Salvador, e contou com a presença de familiares das vítimas.

“Hoje eu estou aqui com o coração sangrando porque está completando um mês que roubaram o meu filho. E eu me pergunto: ‘o que vai acontecer?’, ‘será que eles vão pagar ou isso vai ficar assim?’. Vendo essas mães que também passaram o que estou passando, eu penso: ‘se com elas, que aconteceu há muito mais tempo, nada foi feito, imagino comigo’”, desabafou Silva dos Santos, mãe de Alexandre Santos, morto na Gamboa.

O inquérito sobre o caso segue aberto na Corregedoria da Polícia Militar. A Defensoria acompanhou as oitivas e presta amparo aos familiares dos jovens mortos, atendendo demandas assistenciais e psicossociais. “Nossa atuação neste momento é, principalmente, para que esses depoimentos sejam ouvidos e estejam consignados no curso da investigação. Essas narrativas precisam ser consideradas para que a investigação se dê com o máximo de informações possíveis”, explica a defensora pública coordenadora da Especializada de Direitos Humanos, Eva Rodrigues.

O caso Gamboa completou um mês no dia 1º de Abril.

Em um dos depoimentos prestados no inquérito, um familiar revelou que uma das vítimas foi torturada pelo mesmo policial que participou da ação na Gamboa um ano antes de morrer. “Essa informação, apesar de cruel, dá força para que as famílias consigam mostrar que o que aconteceu não foi uma ação isolada. Que essa questão não é de mera coincidência e que é preciso seguir avançando para que esse caso não fique impune”, avalia Wagner Moreira, representante da ONG IDEAS – Assessoria Popular.

A Polícia Militar informou que não há registro sobre essa tortura formalizada na Corregedoria Geral.

Outro caso acompanhado pela DPE/BA discutido durante o encontro de Segurança Pública e Justiça Criminal foi o de Pedro Henrique Santos Cruz, ativista de Direitos Humanos morto na cidade de Tucano-BA, em 2018. Segundo Ana Maria Cruz, mãe da vítima, o jovem passou a ser sistematicamente intimidado pela polícia após ter denunciado uma abordagem policial que resultou na condenação dos agentes envolvidos em 2012.

“Pedro teve o cuidado de registrar no Ministério Público os seis anos de perseguição policial e não foram tomadas as devidas providências. Somente após sua morte, o MP resolveu pegar algumas dessas denúncias para apurar, mas acabou arquivando porque a pessoa principal para escutar está morta. E agora estamos nessa luta por justiça”, relatou Ana Maria, que é assistida pela DPE/BA.

Ela buscou a instituição após ter sido intimada em um processo no qual era acusada de praticar crime contra a honra. A defensora pública Valéria Teixeira, que acompanha o caso, conta que, até então, Ana Maria responde a cinco processos com o mesmo teor, quatro deles foram arquivados. Além disso, segundo ela, todos os processos eram movidos por policiais que atuavam na região em que Pedro foi morto, sendo que alguns deles estavam envolvidos no caso.

“A família tem tido dificuldade para saber do andamento do inquérito, por isso passamos a fazer também esse acompanhamento das investigações. Mas é uma situação muito difícil porque nossa atuação tem limite. A instituição que tem obrigação e atribuição de fiscalizar a atividade policial é o Ministério Público, por isso cabe a ele dar uma resposta sobre o que está acontecendo e sendo relatado aqui”, ressaltou a defensora pública.

Durante o evento, também falaram as mães de David Fiúza, Rodrigo e Rafael dos Santos Rodrigues e Alisson Silva Brito. O encontro de Segurança Pública e Justiça Criminal foi promovido pela ONG Ideas Assessoria Popular, com apoio da Defensoria Pública do Estado da Bahia, junto a Rede de Justiça Criminal e o Fundo Brasil de Direitos Humanos.