COMUNICAÇÃO
Feira de Santana – Relatório divulgado em reunião geral com a Sesab aponta tuberculose latente e outras doenças infecciosas entre venezuelanos Warao
Reunião buscou construir medidas de prevenção da transmissão coletiva de doenças como a tuberculose, hanseníase, infecção diarreica aguda, covid, pneumonias, entre outras
O relatório de inspeção da equipe de vigilância epidemiológica do Estado sobre a saúde dos venezuelanos da etnia Warao foi divulgado em reunião interinstitucional com a presença da Defensoria Pública da Bahia nesta terça-feira (06), em Feira de Santana. O documento confirmou infecção latente por tuberculose – quando a pessoa tem o hospedeiro, mas ainda não desenvolveu a doença.
A inspeção identificou, ainda, a ausência de orientação nutricional e alimentar; pediculose (piolho); doença diarreica aguda (que pode levar a morte por desidratação); síndrome gripal; e ausência de água potável no local. O relatório aponta, em suas conclusões, a necessidade de articulação interinstitucional para prevenir o contágio coletivo e diminuir a vulnerabilidade social dos Warao.
Além disso, também foi identificada a ausência de profissional qualificado para lidar com população culturalmente diferenciada. A reunião é um desdobramento da operação conjunta realizada entre a DPE/BA e o Núcleo Regional de Saúde na semana passada, dentro do Procedimento de Apuração de Dano Coletivo (Padac) que a instituição abriu em 2023 para verificar a situação dos venezuelanos.
A reunião contou com a presença da Defensoria Pública; da Diretoria de Atenção Básica, da Diretoria de Vigilância Epidemiológica, do Núcleo Regional de Saúde Centro Leste, da Vigilância Epidemiológica Regional NRS Centro Leste, e da Coordenação Regional de Imunização, todas da Secretaria de Saúde do Estado (Sesab). Também participou a Secretaria de Justiça e Direitos Humanos.
No turno da manhã, a Defensoria Pública e as Secretarias Estaduais fizeram um diagnóstico situacional. À tarde, foi concedida palavra para que o Município de Feira de Santana se manifestasse. A finalidade do encontro interinstitucional foi a prevenção de doenças de transmissão coletiva como a tuberculose, a hanseníase, infecção diarreica aguda, doenças de trato respiratório (covid, pneumonias), dermatites graves, verminoses, e outras doenças que podem ser ocasionadas pelas condições de moradia em que eles se encontram.
“O Município admite que realizou apenas 26 exames para verificar quem está infectado (com sintomas) e quem está com a infecção latente, quando é sabido que existem mais 70 pessoas e todas elas precisam ser testadas, para iniciar tratamento e evitar uma possível disseminação da doença. Já sabemos que a garota Jéssika, dois anos, faleceu de tuberculose e desnutrição grave em 23 de janeiro de 2024. A tuberculose foi confirmada em 22 de dezembro, quando estava internada no Hospital da Criança”, explicou o defensor Maurício Moitinho, que acompanha os Warao.
Ele lembra também que há um adulto com infecção latente também confirmada. Outras cinco crianças estão com sintomas, mas são necessários novos exames para verificar tuberculose latente, que não foram feitos pelo Município anteriormente. Todos os 70 Warao precisam ser testados.
Moitinho alerta, ainda, que o relatório de visitação da Sesab aponta situações preocupantes, como o recebimento de forma irregular de cestas básicas (já que a morte aconteceu por desnutrição e tuberculose) e o fato de que os coletores de exames entregues pela Secretaria Municipal de Saúde foram utilizados como brinquedos pelas crianças.
Criação de Comitê
A pedido da Defensoria Pública, após esclarecer restrições quanto a concessão de entrevistas, o Sr. Edy Gomes dos Santos, que coordena o Núcleo Regional Centro Leste, prestou informações técnicas do ponto de vista sanitário:
Assim que foi confirmado o caso de tuberculose (22/12/2023), o Município deveria ter feito uma intervenção para avaliação da condição nutricional (quem está com baixo peso, desnutrido, desidratado), e também a intervenção nutricional em caráter emergencial, visando garantir o reestabelecimento dos padrões nutricionais aceitáveis para evitar novas internações. Já que outras duas crianças foram internadas com os mesmos sintomas, e visivelmente várias crianças tem aspecto característico de desnutrição severa, deveria ter sido feita a coleta de exames séricos (exames de sangue, para a identificação de hipovitaminoses para evitar a doença de escorbuto).
Apesar das ações serem de competência da atenção básica, o Município de Feira de Santana admitiu na reunião que não consegue realizar todas as ações necessárias sem a ajuda de outros entes. Foi pactuado para o dia 27 de fevereiro uma nova reunião, onde, dentre outras coisas será criado um comitê interinstitucional entre a Defensoria Pública, Secretaria de Justiça e Direitos Humanos, Diretoria de Atenção Básica do Estado da Bahia, Diretoria de Vigilância Epidemiológica do Estado da Bahia, Núcleo Regional de Saúde Centro-Leste, Secretaria Municipal de Saúde, Secretaria Municipal de Educação e Secretaria Municipal de Desenvolvimento Social.
Na reunião, foi definido que a Atenção Básica do Município de Feira de Santana deverá apresentar um relatório das ações desenvolvidas e um plano operativo para intervir nas ações necessárias, até a reunião que será feita em fevereiro.
De acordo com Moitinho, a maior dificuldade relatada pelo Município de Feira de Santana na reunião foi comunicação com os Waraos, que não falam português brasileiro. No entanto, foi sugerido que houvesse diálogo com quem acompanha os Warao desde que chegaram a Feira, em 2020.
“Foi apresentado o nome de um membro do Movimento Nacional da População em Situação de Rua, a assistente social Carla Freitas, que nas instituições estaduais é unanimidade que consegue manter esta interlocução com os Warao, bem como foi apresentada a necessidade de ela compor o Comitê. No entanto, a representante da SEDESO repreendeu o referido nome, alegando que o Movimento não teria legitimidade”. O argumento não foi aceito pela Defensoria Pública, nem pelos demais presentes, já que um dos princípios constitucionais que regem a matéria é a participação da comunidade.