COMUNICAÇÃO

"Fortalecimento do Viver não é gasto, mas sim, investimento", garante DPE em audiência

20/06/2016 20:04 | Por CAMILA MOREIRA DRT 3776/BA (Texto e fotos)

Audiência pública promovida pela DPE em parceria com Comissão das Mulheres ocorreu nesta segunda-feira, 20, no Centro Cultural da Câmara de Vereadores

"O fortalecimento do Serviço de Atenção a Pessoas em Situação de Violência Sexual – Viver, a partir da contratação do número ideal de profissionais que garantam seu funcionamento às pessoas que procuram o serviço não é gasto, mas sim, investimento público".
A afirmação é da defensora pública Gisele Aguiar, da Especializada de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente da Defensoria Pública do Estado da Bahia DPE/BA. Aguiar posicionou-se contra a atual situação de insuficiência de profissionais e o fechamento de uma das unidades do serviço, durante audiência pública promovida pela DPE em parceria com a Comissão dos Direitos da Mulher da Câmara de Vereadores, para debater a questão nesta segunda-feira, 20. Ainda durante a audiência, a DPE apresentou Nota Recomendatória à contratação de profissionais e abertura da unidade Viver do Subúrbio, assinada pelos presentes, e que deverá ser entregue ao governador Rui Costa em reunião.

De acordo com Gisele Aguiar, a insuficiência de profissionais no serviço Viver chegou ao conhecimento da Defensoria a partir dos atendimentos feitos às famílias de vítimas de violência sexual. De acordo com relatos de mães, o número reduzido de psicólogas, assistentes sociais, médicas, advogadas e outros profissionais que integram a equipe multidisciplinar do Viver comprometia o serviço oferecido às vítimas e seus familiares. Com apenas uma servente, a 2ª unidade de atendimento do serviço, localizada na DEAM de Periperi, fechou temporariamente as portas no início desse ano. A outra, localizada no Instituto Médico Legal Nina Rodrigues, ameaça seguir o mesmo caminho, também por falta de profissionais. Apenas nove dos 44 profissionais necessários à manutenção ideal do serviço atuam hoje na unidade.

Segundo Dayse Dantas Oliveira, coordenadora do Viver, desde que foi criado, em 2001, o serviço registrou ao todo 11.271 atendimentos até outubro de 2015. Apenas em 2015, segundo o órgão, foram atendidos 431 casos, com 369 mulheres que sofreram algum tipo de violência sexual. A violência mais comum é o estupro de vulnerável, totalizando 217 ocorrências. A faixa etária mais atendida foi de adolescentes entre 12 e 15 anos, somando 107 casos.

A gestora da unidade, vinculada à Secretaria de Segurança Pública – SSP, através da Superintendência de Prevenção a Violência SUPREV, acredita, no entanto, que até o final do ano a situação terá mudado, com a reabertura da unidade localizada no Subúrbio e a contratação em regime Reda de profissionais para a equipe multidisciplinar de atendimento, o que não ocorreu até hoje, segundo ela, por uma restrição orçamentária da SSP.

Mulheres integrantes de diferentes movimentos e associações, funcionárias do Viver e familiares de vítimas atendidas pelo serviço, no entanto, rechaçaram o argumento orçamentário. Para elas, o que falta é entender o Viver como um serviço prioritário dentro da rede de atenção e proteção às mulheres. Para Ana Caren, médica residente do Posto de Saúde da Família do Alto do Cabrito e integrante do Coletivo Feminista, "o sucateamento e quase abandono do serviço reflete descaso do poder público aos serviços oferecidos pelo Estado". Segundo Caren, a forma de contratação dos profissionais, via Reda, ainda demonstra a precarização de trabalho a que estes profissionais são submetidos.

Para Selma Evangelista, psicóloga do Viver, trabalhar com pessoas que chegam à unidade em completa situação de desespero requer o envolvimento total e irrestrito do profissional. O que faz com que as medidas para reverter o quadro insuficiente de funcionários sejam mais do que urgentes. "É preciso sair do discurso e ir para a prática", pontuou.

Em Carta Aberta, o Coletivo Feminista Ana Montenegro também afirmou estar o serviço "sucateado e abandonado", e convocou a população a "lutar pela manutenção do Viver e pela garantia dos subsídios que permitam sua existência". Ainda em Carta Aberta, o coletivo feminista Madás, da Faculdade de Direito da UFBA, pede a realização de concurso para criação de cargos efetivos, "evitando a instabilidade de contratações pelo Reda".

Ouvidora da Defensoria Pública, Vilma Reis criticou a ausência de profissionais efetivos no serviço. Para ela, é incabível que existam quebras de atendimentos com a mudança periódica de funcionários, uma espécie de "desmonte de histórias" da instituição. "Essa audiência pública acontece porque não aguentamos perder mais", destacou.

Presidente da Comissão das Mulheres da Câmara, a vereadora Aladilce Souza pediu providências quanto ao quadro atual do Viver, mas destacou o trabalho que é desenvolvido mesmo com todas as dificuldades pelos profissionais atuais. 'Gostaria de ressaltar a excelência e o envolvimento dos profissionais que fazem parte do serviço, mas também encontramos uma carência muito grande de profissionais. É fundamental que essas entidades se reúnam todas por esta causa tão importante. A presença de todas essas entidades só reforça essa luta, sobretudo num momento em que a violência sexual é tão discutida", afirmou a vereadora.

NOTA RECOMENDATÓRIA

Assinada por cerca de 130 pessoas, a Nota Recomendatória Conjunta produzida pela Defensoria Pública, a partir da Especializada de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente e da Especializada de Proteção aos Direitos Humanos, recomenda que o projeto Viver seja devidamente reestruturado através da contratação de pessoal qualificado para atuar na área jurídica, psicossocial, administrativa e de saúde, devendo ser assegurada contratação de profissionais em número suficiente para atender toda a demanda de modo a ofertar e manter o adequado atendimento aos usuários (pessoas em situação de violência sexual e seus familiares).

A Nota recomenda também que seja reaberta a sede do projeto Viver na região de Periperi, devendo haver contratação de profissionais qualificados também para o atendimento às crianças, adolescentes, jovens, adultos e idosos em situação de violência sexual, bem como seus familiares. Outra orientação diz respeito à capacitação dos profissionais de forma a atender tanto às vítimas quanto aos seus familiares.

A realização de concurso efetivo para contratação dos funcionários do serviço também deverá ser incluída na recomendação. A demanda foi apresentada por boa parte dos presentes à audiência pública desta segunda-feira. A partir da sua protocolização, as autoridades terão 15 dias para enviarem respostas acerca das providências adotadas para o atendimento da Recomendação. A não observância implicará na adoção de medidas judiciais cabíveis por parte da DPE, como a impetração de Ação Civil Pública, por exemplo.

Uma reunião entre integrantes da Rede de Atenção e Proteção à Mulher deverá ocorrer nesta terça-feira, 20, na sede da DPE, para finalizar a Nota Recomendatória e alinhar detalhes sobre ato a ser realizado no próximo dia 5 de julho em frente ao Viver.

VIVER

Considerado um serviço de referência e pioneiro na Bahia, o Viver foi pensado para acolher a vítima de violência sexual e família, contando com uma equipe multidisciplinar composta por médicos, psicólogos, assistentes sociais, enfermeiros e advogados que asseguram o acolhimento médico e psicossocial, bem como acompanhamento dos processos judiciais às pessoas vítimas de violência sexual – sejam crianças, mulheres ou LGBTs. De 2009 até 2015, mais de 5.000 novos casos passaram a ser acompanhados pelo serviço. Do total, 3.732 foram vítimas que tinham entre zero e 15 anos. 4.550 são do sexo feminino.

Estiveram presentes a subcoordenadora de Direitos Humanos, Eva Rodrigues e a subcoordenadora da Especializada de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente, Maria Carmen Novaes, as defensoras públicas Laíssa Araújo, também da Especializada de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente, e Roberta Braga, do Núcleo do de Defesa da Mulher – NUDEM, bem como o defensor público Rodrigo Assis, também do NUDEM. Outra que participou do evento foi a diretora da Escola Superior da Defensoria – Esdep, Firmiane Venâncio.