COMUNICAÇÃO

Gamboa – Defensoria presta atendimento jurídico e psicossocial aos familiares de jovens mortos

07/03/2022 17:11 | Por Ailton Sena DRT 5417/BA

A Especializada de Direitos Humanos, por meio do Núcleo Amparo, vai garantir orientação relacionada a demandas diversas; no final do inquérito, Instituição pode ingressar com ação indenizatória

Ainda consternados pelo luto, os familiares dos três jovens mortos durante uma ação da Polícia Militar na comunidade da Gamboa, em Salvador, participaram na última sexta-feira (4) de uma reunião de acolhimento na Casa de Direitos Humanos da Defensoria Pública da Bahia (DPE/BA). O encontro marcou o início do atendimento que será prestado pela instituição, através do Núcleo Amparo, que integra a Especializada de Direitos Humanos.

Entre as explicações sobre o papel da Defensoria, prestadas pelas defensoras públicas Eva Rodrigues e Lívia Almeida, que coordenam a Especializada de Direitos Humanos, o silêncio provocado pela dor das perdas ocorridas três dias antes daquele encontro dava espaço para um desabafo do sofrimento. “Eles não tinham o direito de fazer isso comigo e nem com mãe nenhuma. Não podiam ter tirado esse pedaço de mim. Isso tem me doído tanto”, externalizou a mãe de um dos jovens.

Por meio do Núcleo Amparo, a DPE/BA vai prestar atendimento a ela e as outras mães e familiares vitimadas pela atuação da PM na Gamboa. Além de prestar orientação e esclarecimentos acerca dos procedimentos e medidas adotadas para a investigação dos responsáveis pelo ocorrido, a instituição poderá acompanhar os familiares durante as oitivas em delegacia e atender outras demandas de acesso à justiça. Somente ao final do inquérito, a Defensoria pode acionar a Justiça com ações indenizatórias.

“O papel da Defensoria não é investigar, nós não temos essa atribuição. Nosso papel é de acolhimento e orientação. E, uma vez finalizado o inquérito policial, existe também a possibilidade de ingressarmos com um pedido de demandas indenizatórias. A Defensoria Pública representa o interesse de vocês, familiares, perante a justiça”, explicou a defensora pública Eva Rodrigues.

Além disso, há as demandas que não estão diretamente ligadas às mortes. Também coordenadora da Especializada de DH, a defensora pública Lívia Almeida destacou a importância de que o Estado se volte para atender às necessidades da comunidade que vão além da apuração e punição dos agentes envolvidos e da prevenção para que outros casos não aconteçam.

“Estamos falando de pessoas que estão com dificuldade para tirar uma certidão de nascimento, de fazer matrícula escolar, exames básicos. É nosso papel cobrar e acompanhar as instituições responsáveis pela investigação, mas também é nosso papel atender e fazer os encaminhamentos dessas outras demandas”, sinalizou.

Atendimento Psicossocial

O Núcleo de Atendimento Psicossocial (NAP) da Defensoria tem papel fundamental no processo de identificação das necessidades dos familiares. “Embora o nosso Núcleo não faça acompanhamento psicoterapêutico ou de terapia clínica, fazemos a escuta e acolhimento dessas pessoas que estão em sofrimento e, a partir desse contato, nós vamos compreender quais seriam as instituições mais adequadas para acompanhamento”, explica a psicóloga Vanina Miranda da Cruz.

Através do Núcleo, a Defensoria fará a interlocução com os serviços psicossociais existentes no município para garantir o suporte necessário aos familiares dos três jovens mortos na Gamboa. De acordo com a defensora Eva Rodrigues, uma das possibilidades é a de encaminhamento para benefícios assistenciais. “Muitas vezes, em se tratando de jovens, eles acabam sendo o arrimo de família, aquela pessoa que provê o sustento. A ideia é prestar um atendimento que vá além da demanda judicial”, explicou.

Luta por justiça

Além da reunião com a Defensoria, os familiares dos jovens mortos na Gamboa têm realizado uma verdadeira itinerância para garantir o esclarecimento do caso e punição dos responsáveis. Na quinta-feira, 3, eles participaram da reunião do Conselho Estadual de Proteção aos Direitos Humanos do Estado da Bahia – CEPDH e vão agendar uma reunião com o Ministério Público.

As iniciativas têm sido articuladas pela organização da sociedade civil IDEAS – Assessoria Popular, que também esteve presente da DPE/BA e destacou a importância da rede de cuidados que tem possibilitado aos familiares procurar os espaços de denúncia. “Essa rede tem esse poder de acionar o Estado a partir dos seus órgãos para fazer essa luta por justiça, que não é fácil e nem é rápida. Por isso, precisamos fazer caminhar o tempo da comunidade e o tempo da ação institucional”, pontuou o representante da ONG Wagner Moreira.

Durante a reunião do CEPDH, do qual a DPE/BA é membro, foram encaminhados pedidos para disponibilização dos laudos das mortes, acesso ao procedimento de investigação instaurado na Corregedoria e o envio de ofícios à Secretaria de Segurança Pública para garantir a segurança da comunidade. A DPE/BA, de maneira autônoma, vai reforçar os pedidos através de ofícios.

“A gente torce para que todas as medidas possam ser tomadas porque eles não podiam fazer isso com ninguém. A gente tá aqui lutando por justiça e, para isso, contamos com essa rede de apoio, com vocês”, assinalou a mãe de outro jovem que morreu.

DPE/BA participa de exibição do documentário no Cine MAM

“Enquanto associação, estamos lutando para proteger nossos corpos pretos. Queremos a punição dos responsáveis e que a Secretaria de Segurança Pública treine os policiais para proteger a sociedade e não para matar”, completou a presidenta da Associação de Moradores da Gamboa, Ana Caminha, que também esteve presente durante o encontro na Defensoria.

Sem Descanso

Neste domingo, 1, a Defensoria participou da exibição do documentário ‘Sem Descanso’, que conta a jornada de Sr. Jurandy para elucidar a morte do seu filho Geovane. O evento em protesto contra as mortes na Gamboa aconteceu na sala do cinema do Museu de Arte Moderna com objetivo de discutir, justamente, o tema do abuso e da violência em ações da polícia. Embora já tenha havido elucidação do crime, os policiais envolvidos ainda não foram levados a julgamento.

“Ambos os casos estão interligados, pois se tratam de abordagens equivocadas do Estado que geram reflexos gravíssimos na vida dessas famílias e de toda a comunidade. Então é importante que tenhamos uma resposta. Essas famílias já sofreram o pior que qualquer ser humano pode sofrer, que é a violação dos seus direitos, do direito à vida e direito à dignidade pelo próprio Estado”, frisou a defensora pública Lívia Almeida.