COMUNICAÇÃO
INFÂNCIA – Encontro de defensores públicos da Infância na Bahia teve início nesta quinta-feira para discutir desafios da área diante do cenário atual
Palestra inicial abordou “A decretação da suspensão liminar do poder familiar e a determinação para a colocação de crianças e adolescentes em família substituta”, com o defensor público de São Paulo, Peter Molinari, e mediação da defensora da Bahia, Talitha borges
Nesta quinta-feira, 27, teve início o III Encontro de Defensores Públicos e Defensoras Públicas da Infância na Bahia, realizado de forma virtual, por conta do novo Coronavírus. Realizado pela Defensoria Pública do Estado da Bahia – DPE/BA, o evento debateu nesta edição os desafios enfrentados pela Instituição neste cenário atual, que envolve não apenas a crise sanitária pela qual passa o Brasil em 2020, mas também a redução de direitos e ataques à infância e à juventude, o alinhamento de condutas sobre os serviços prestados no estado, além de trocas de experiências sobre o tema.
Na abertura, o defensor público geral, Rafson Ximenes, comentou sobre ataques à infância e à juventude, por meio de discussões sobre a redução da maioridade penal e defesa do trabalho infantil, mas também destacou a atuação das Defensorias da União, da Bahia e de outros estados, enquanto instituições que asseguram os direitos dos assistidos, embora seja relativamente recente.
“Está chegando a hora em que o desafio será tão grande que a Defensoria não poderá mais ser uma Instituição em fase de amadurecimento. Temos que amadurecer e amadurecer também a forma de defender nossos assistidos, pensar na melhor forma de atuar para conseguir os melhores resultados é muito importante. Vão existir pressões políticas contrárias, mas precisamos saber como lidar com elas”, comentou.
O defensor-geral elogiou ainda a Especializada de Proteção aos Direitos da Criança e do Adolescente e relembrou atuações importantes da DPE/BA, durante a pandemia, que apesar de encontrarem resistência por parte do Governo do Estado, geraram efeitos positivos na Bahia: o pagamento do auxílio para estudantes de escolas públicas e a lei para proibir o corte de água e de energia elétrica das pessoas de baixa renda.
“Isso é um reflexo de que quem está no protagonismo, na vanguarda da inclusão social no estado baiano, é a Defensoria Pública da Bahia”, finalizou Rafson Ximenes.
Coordenadora da Escola Superior da Defensoria da Bahia – Esdep, a defensora pública Soraia Ramos destacou que a especializada da infância está sempre à frente na garantia dos direitos das crianças e adolescentes. “Ao trazer diversas ideias e realidades, esse encontro será um marco para a Defensoria baiana. São temas importantes não apenas para a infância, mas que interessam a todos nós que atuamos na defesa dos direitos”, afirmou Soraia Ramos.
Defensora pública coordenadora da Especializada de Proteção aos Direitos da Criança e do Adolescente, Gisele Aguiar pontuou as deficiências de estruturas nos níveis municipal e estadual. “O tema não foi escolhido por acaso, pois ser defensor da infância e juventude é um desafio maior ainda. Falta assistência social, falta uma efetiva inclusão na área de educação, inclusive pra crianças com deficiência, falta um programa de estágio e aprendizado para jovens que estão em unidade prisional ou no sistema socioeducativo, além da falta de acolhimento institucional nos municípios”, além de outras deficiências existentes.
Suspensão do poder familiar e família substituta
Palestra inaugural da programação tratou sobre “A decretação da suspensão liminar do poder familiar e a determinação para a colocação de crianças e adolescentes em família substituta”, com o defensor público de São Paulo, Peter Gabriel Molinari Schweikert, e mediação da defensora pública da Bahia, Talitha Viegas Borges. Introduzindo o tema, Talitha trouxe exemplo de situações constantes no município onde atua, em que crianças são alocadas em famílias substitutas porque o abrigo institucional não é capaz de fornecer aquilo para a criança, o que decorre da ausência de políticas públicas.
O defensor público Peter Molinari apresentou uma tese institucional: de que violam o requisito negativo da tutela de urgência a decretação da suspensão liminar do poder familiar e a determinação para colocação de crianças e adolescentes em família substituta mediante acionamento do Cadastro de Pretendentes à Adoção antes da conclusão da ação de destituição do poder familiar, configurando tal decisão julgamento antecipado do mérito, vez que impede qualquer decisão em sentido diverso ao final do processo.
Foram resgatadas premissas teóricas, apresentadas a natureza jurídica da decisão de suspensão liminar do poder familiar (com base no artigo 157 do Estatuto da Criança e do Adolescente), além da impossibilidade de acionamento prematuro do Cadastro de Pretendentes à Adoção.
“Uma das premissas é que não há regras absolutas, e essa tese não pode ser absoluta, mas uma eventual exceção confirma a tese. Existem situações em que talvez haja uma certa proporcionalidade na colocação antecipada, mas a gente não pode usar o subterfúgio do superior interessa da criança, pois isso é extremamente subjetivista. Precisamos pensar de forma técnica uma metodologia para conseguir avaliar o caso concreto”, afirmou o defensor.
A proposta trazida por Peter é incorporar a regra da proporcionalidade e lembrar que existem três subregras: a adequação, a necessidade e a proporcionalidade em sentido estrito. A adequação é a análise dos fins, de como uma intervenção no âmbito do direito fundamental, ao promover um direito fundamental colidente, consegue de fato atingir este último.
A análise da necessidade é a comparação de medidas que promovam o mesmo fim – e neste caso devem ser considerados o direito da criança e da família de origem de conviverem entre si versus o direito da criança de viver com outra família, caso não seja possível de fato viver com a de origem. “Só pode ser considerada proporcional na perspectiva da necessidade a colocação antecipada, caso se demonstre que todas essas alternativas foram esgotadas. Por fim, a gente passa para a ultima análise, a proporcionalidade no sentido estrito”, explicou o defensor.
Ao fim da explanação, Talitha Borges comentou sobre os pontos abordados por Peter nesta palestra inicial, tais como a importância de ponderar que a tese precisa ser muito bem aplicada e não generalizada, conforme apontou o defensor.
“Por sermos uma instituição de âmbito estadual e nacional, precisamos pensar de forma estratégica a consequência das nossas ações individuais. E nesse ponto acho interessante, pois assim como observamos uma generalização de decisões que colocam de forma liminar em família substituta, a gente também não pode puxar para a normalização no sentido contrário, pois cada caso tem suas peculiaridades”, comentou Talitha Borges.