COMUNICAÇÃO
Interioriza: Defensoria promove terceira edição de mutirão jurídico em comunidades com dificuldade de acesso à justiça
Serviços foram realizados em 15 localidades, com o apoio das prefeituras locais, além do acompanhamento da DPE de Mato Grosso, que pretende levar o projeto para o estado
Levar serviços jurídicos gratuitos e de qualidade até as comunidades mais distantes para atender aqueles que mais precisam. Esse é o objetivo do projeto Interioriza Defensoria, que chegou a sua terceira edição desbravando os lugares mais isolados da Bahia e contando com o apoio e mobilização dos usuários, da população em geral e das prefeituras que abraçaram este mutirão da Defensoria Pública da Bahia (DPE/BA). A ação teve, inclusive, a visita da Defensoria Pública de Mato Grosso, que veio acompanhar a ação em Vila de Abrantes para levar o Interioriza para seu estado.
Apesar de um dia de mutirão, em Pau Brasil, no Sul do Estado, a ação começou mais cedo, na quarta-feira (27), e durou três dias, beneficiando a comunidade indígena da reserva Caramuru-Paraguaçu. O dia D foi na última sexta-feira (29). Pertencente à regional de Itabuna, Pau Brasil prestou 112 atendimentos. A maior procura foi por retificação de documentos. De acordo com a coordenadora da Regional Itabuna, Aline Müller, o evento foi bastante positivo e atendeu boa parte da demanda reprimida. “Nossa ideia é voltar nos próximos meses para novos atendimentos e também para dar uma resposta às questões já notificadas”, afirmou.
Seu João de Oliveira Rodrigues Lima procurou o mutirão do Interioriza, pois nunca teve documentos. Aos 67 anos, nunca votou, nunca abriu conta em banco nem teve qualquer direito trabalhista assegurado. Lavrador, até para ir ao hospital, precisava do nome e documento do patrão, ou da boa vontade de conhecidos, para conseguir atendimento médico. Ao saber que haveria um mutirão na reserva indígena, viajou da Aldeia Bahetá, em Itaju do Colônia, em busca de atendimento. Ao pessoal da Defensoria, alegou ter nascido em casa, não ter certidão de nascimento nem ter parentes vivos. “Eu sei o nome dos meus pais, porque meu avô me disse. Estou nessa situação há muito tempo. É bem difícil”, contou.
No caso de seu João, a Defensoria tem um longo caminho pela frente. Precisa fazer uma busca ativa nos cartórios da região e ver se encontra algum assento de nascimento. Caso encontre, emite certidão. Caso não, elabora requerimento de abertura de registro tardio. Foi o que explicou o defensor Mateus Ferreira Costa. A sede da Defensoria mais próxima para seu João é a de Camacã, a cerca de 70 quilômetros de onde vive. Essa unidade foi inaugurada em junho passado, como parte do plano de expansão e interiorização da Defensoria Pública do Estado da Bahia. Antes, o atendimento mais próximo era em Itabuna, ainda mais distante.
Seu Jovanildo Pereira, 70 anos, procurou o Interioriza para judicializar ações na área de Direito do Consumidor. “Esse serviço veio na hora certa. Eu sou aposentado e preciso resolver um bocado de cobranças e juros que acabaram meu crédito”, explicou. Já Jaqueline Borges queria retificar o documento dos filhos, mas descobriu, durante o atendimento, que também podia fazer o reconhecimento de paternidade pela Defensoria. “Eu não sabia que podia reconhecer a paternidade com o pai já falecido. Foi uma ótima notícia! Agora vou procurar a família dele para fazer o DNA e vamos à Defensoria, com certeza”, comentou.
O defensor Mateus Ferreira Costa, titular de Camacã da área Cível, afirmou que o Interioriza é uma ação muito importante, porque apesar de Pau Brasil ficar próximo de Camacã, muitas pessoas não conseguem se deslocar até lá. “Vir aqui e ofertar esse serviço diretamente garante que essa comunidade tenha acesso a seus direitos”, concluiu. O mutirão jurídico contou com a participação de dois defensores e oito servidores, incluindo equipes de Itabuna, Camacã e Salvador.
A Defensoria se articulou com outras instituições e órgãos para levar um amplo leque de serviços à comunidade indígena Caramuru-Paraguaçu, fazendo do Interioriza um grande mutirão de várias frentes. Além da DPE, participaram instituições como Funai, INSS (Instituto Nacional de Seguridade Social), Secretaria da Saúde Indígena (Sesai), secretaria estadual de Desenvolvimento Rural, Cartório de Registro Civil de Pessoas Naturais de Pau Brasil, secretarias de Saúde e de Trabalho e Ação Social de Pau Brasil, prefeitura de Camacã, com apoio de transporte, Câmara de Vereadores de Pau Brasil, além do Instituto Eco Bahia.
Vila de Abrantes
Em Vila de Abrantes, localidade abrangida pela 7ª Regional, de Camaçari, os exames de DNA para reconhecimento de paternidade foram o carro chefe. Entre as demandas desse tipo, o caso de Edna Almeida e Maria Conceição Oliveira chamou atenção. Ambas procuraram a Defensoria separadamente para realizar coleta de material genético e registrar o nome dos respectivos filhos falecidos na certidão de nascimento dos netos. Ocorre que a história delas tem um ponto em comum: as crianças são irmãs por parte de mãe, também já falecida, e agora, com a ausência dos genitores, passaram a ser responsáveis pela criação dos pequenos, pedindo, por isso, ainda a guarda.
Tanto Edna quanto Conceição têm dois netos, frutos desses relacionamentos: um menino e uma menina, cada. Entre eles, apenas a neta de Edna já tinha o nome do pai e da mãe no registro. Além dos quatro, as mulheres relataram que a mãe deixou mais duas crianças, sendo a mais nova um bebê de meses. Com o sucesso do Projeto Interioriza, representantes da Defensoria Pública do Estado do Mato Grosso vieram à Bahia acompanhar a ação, que ocorreu na Escola Municipal Eliza Dias. O secretário executivo da instituição mato-grossense explicou que pretendem realizar uma iniciativa parecida por lá e estão pesquisando a melhor logística para os atendimentos simultâneos.
“Nós temos estados com características parecidas em relação ao tamanho do estado, temos municípios distantes da capital, localidades distantes das sedes dos municípios, e é um desafio levar o atendimento da Defensoria que vivem mais isoladas. Então estamos aqui hoje para aprender e compartilhar experiências”, disse. Ao todo, atendemos, de forma simultânea, 15 locais onde o acesso à justiça ainda precisa de atenção. A 12ª regional, de Jequié, foi até o município de Aiquara, terra natal do governador do Estado, Jerônimo Rodrigues. Os povoados quilombolas em São Gabriel e Caetité também foram abraçadas pelo Interioriza.