COMUNICAÇÃO
Liberdade na Estrada: projeto que percorre presídios com a Unidade Móvel da Defensoria chega a Juazeiro e atende 330 presos provisórios na primeira viagem
Durante a análise dos processos, Instituição garantiu o direito de liberdade de internos que já tinham Alvarás de Soltura expedidos e que não foram cumpridos anteriormente
“O que me mantém vivo neste presídio é a esperança de receber visita e rever a minha família, que está tão longe”. Exatamente nos dias de visita, os presos provisórios que estão no Conjunto Penal de Juazeiro receberam uma visita que não era dos familiares, mas que eles consideraram tão especial quanto. Era o projeto “Liberdade na Estrada”, de iniciativa da Especializada Criminal e de Execução Penal da Defensoria Pública do Estado da Bahia – DPE/BA e que, entre os dias 4 e 7 de outubro, depois de percorrer 500 quilômetros entre Salvador e Juazeiro, atendeu e analisou a situação processual dos 330 internos que não são da comarca e ainda aguardam sentença.
O nome do projeto fez tanto sentido que a notícia de que a Unidade Móvel de Atendimento da Defensoria estava estacionada no pátio se espalhou rapidamente por todos os módulos onde estavam os presos provisórios. A expectativa pelo atendimento era tanta que assim que a notícia chegou a uma das celas do módulo 2, um dos internos anotou todas as dúvidas em uma folha de papel higiênico. “É para não esquecer nada”, revelou, enquanto era atendido e perguntava sobre os mais de 15 tópicos que escreveu.
“A Defensoria é a única Instituição que, efetivamente, vai às prisões. Este projeto leva um novo olhar, uma nova esperança, leva a assistência jurídica integral e gratuita para essas pessoas privadas de liberdade. Em quatro dias, encontramos diversas situações: quem ainda estava preso apesar de já ter alvará, quem não deveria estar aqui e muitas outras irregularidades processuais. Além disso, solicitamos expedição de Cartas de Guia [em que o preso provisório é transferido para o respectivo regime de cumprimento de pena determinado na sentença] e impetramos, até agora, 14 Habeas Corpus”, enumerou a coordenadora da Especializada Criminal e de Execução Penal e autora do projeto, Fabíola Pacheco.
“Eu estava esquecido nesse lugar. Foi preciso a Defensoria chegar”
A ansiedade em ser atendido pela Defensoria e ter acesso a informações sobre a tramitação dos seus processos ganhou ainda mais força quando, ainda no primeiro dia, a atuação do ‘Liberdade na Estrada’ garantiu o direito de liberdade ao mecânico E.N.M, 33 anos.
Durante a análise da situação processual, a DPE/BA identificou um Alvará de Soltura expedido desde julho de 2022 e que não tinha sido cumprido antes porque a Vara Criminal da comarca não tinha encaminhado o documento para a unidade. A notícia foi dada ao mecânico em plena Unidade Móvel e, menos de 1h após o atendimento, ele ganhou sua liberdade e pegou o caminho de volta à sua cidade. “Eu estava esquecido nesse lugar. Foi preciso a Defensoria chegar para dar um ponto final em minha história aqui dentro”, agradeceu ele.
Também natural de outra cidade, que fica há mais de 400 quilômetros de distância, o ajudante geral A.S.S.S, 27 anos, lembra muito bem a data em que foi transferido para Juazeiro e, desde então, não recebe a visita dos familiares.
“É muito longe e, para eles, é uma viagem que custa muito caro. Desde o dia em que caí aqui faço a contagem e, graças à Defensoria, essa conta acaba hoje: foram 8 meses e 19 dias”, contou, minutos antes de, no segundo dia do Liberdade na Estrada, também atravessar os portões e ganhar sua liberdade.
Já o lavrador G.A.C, 23 anos, mesmo tendo um advogado, foi atendido pela Defensoria, pois tinha acabado de participar de uma audiência por videoconferência, não entendeu nada do que foi dito e não teve orientação do advogado após o término da audiência. “Seu alvará de soltura vai ser expedido”, anunciou uma das servidoras durante o atendimento. “Foi isso que disse lá? Estou livre?”, perguntou, sem acreditar.
DNA: motivo para lutar por uma nova vida
A prova de que a Defensoria não mede distância para garantir os direitos de quem precisa é que o ajudante L.S.O, 19 anos, teve dois atendimentos. O primeiro sobre foi a análise do seu processo e o segundo foi a coleta de seu material genético para o exame de DNA com o suposto filho que mora em uma das cidades onde a Unidade Móvel de Atendimento passou este ano. “Ainda não conheço ele, só vi por uma foto que minha trouxe no dia da visita. Se o exame confirmar, vai ser o meu primeiro filho e é por ele que vou lutar para ter uma nova vida, longe daqui”, revelou.
E, por falar em longe, uns presos provisórios vieram de longe e outros de perto: tem gente das cidades de América Dourado, Barra, Canarana, Canudos, Casa Nova, Curaçá, Catu, Filadélfia, Gavião, Ilhéus, Irecê, Jaguarari, Miguel Calmon, Monte Santo, Pilão Arcado, Presidente Dutra, Quixabeira, Remanso, Rio Verde, São Gonçalo dos Campos, São Gabriel, Saúde, Senhor do Bonfim, Sobradinho e Uauá. Tem, também, quem veio de Brasília e de outros estados como Pernambuco, Rio Grande do Norte, Paraná e São Paulo.
“A gente tem que pagar pelos nossos atos, mas também não podemos ficar nesta situação de provisórios a vida toda”, desabafou o agricultor A.B.S, 39 anos. “É uma condição provisória que ganha caráter de antecipação de pena”, observou o cabeleireiro A.L.M.S, 22 anos. “Quem é de fora fica esquecido”, revelou o pintor D.O.S, 26 anos. “A única visita que recebi desde que entrei aqui é a de vocês”, lembrou o reciclador M.C.D, 30 anos.
Equipe que fez o Liberdade na Estrada acontecer
A parada do Liberdade na Estrada no Conjunto Penal de Juazeiro contou com a atuação da coordenadora Fabíola Pacheco, do coordenador da 5ª Regional da Defensoria, sediada em Juazeiro, André Lima Cerqueira, da defensora que atua na área criminal em Salvador, Larissa Guanaes, dos defensores que atuam na área criminal em Juazeiro, Ananda Benevides, Paula Almeida e Wesclei Pedreira, dos servidores da Especializada Criminal e de Execução Penal, Isadora Cardim, Jorge Fialho Neto e Leone Lima Cerqueira, das servidoras de Juazeiro, Amanda Oliveira de Paula e Maira Thiebaut, do servidor que atua na área administrativa e operacional da Unidade Móvel, Marcos Silva, do técnico em informática Luís Augusto Cruz, da jornalista Ingrid Carmo, dos motoristas Marcelo Souza, Roberto Reis e James Magalhães, dos artífices André Dias e Raimundo Câmara, das estagiárias Cleony Pereira e Raquel Santana e do estagiário Ícaro Reis.
“Foi um atendimento que fluiu muito bem e que conseguimos, devido ao know how que trouxemos da capital, atender a 330 presos provisórios em quatro dias. Obrigada à Administração Superior da Defensoria por acreditar neste projeto e a toda essa equipe que fez o Liberdade na Estrada acontecer. Que venha a próxima viagem: Paulo Afonso”, anunciou a coordenadora, ainda sem data definida, estendendo os agradecimentos à direção, à coordenação operacional e a toda equipe de segurança do Conjunto Penal de Juazeiro.