COMUNICAÇÃO

Machismo e racismo interferem na construção da masculinidade, aponta pedagoga em roda de conversa

10/10/2019 19:58 | Por Pollyana Moraes - Estagiária, sob supervisão de Tunísia Cores DRT 5496/BA

Temática abordou a construção do comportamento do homem através das gerações em evento da Defensoria

“O machismo, por já estar enraizado, deve ser discutido por todos os segmentos populacionais, buscando entender sua origem a fim de mudar seu estado”, diz defensora pública e coordenadora da Especializada do Idoso, Laise Carvalho, durante abertura da roda de conversa: A construção do homem através das gerações.

O evento, promovido pela Especializada do Idoso da Defensoria Pública do Estado da Bahia – DPE/BA, na quarta-feira, 9, foi sediado no auditório da Escola Superior – Esdep, no Canela, em Salvador, e faz parte da comemoração do dia internacional do idoso, que ocorreu no dia 1º de outubro.

Para a defensora, o objetivo é conscientizar e inserir as pessoas idosas nas discussões contemporâneas da sociedade. “É papel da Defensoria criar espaço de fala para os assistidos, de forma que discussões saudáveis aproximem este público dos eventos da atualidade”.

Infância

A mestra em Educação e Praxis Pedagógica, fundadora da empresa Ka Naombo e Artes, Patrícia Santos Silva, iniciou a discussão apresentando seu trabalho que está atrelado a confeccionar bonecos e bonecas. A iniciativa foi levada às escolas soteropolitanas. “No início, os meninos tinham um recuo com relação à ideia de brincar de boneca, diziam ser coisa de menina e desconstruir isso fez parte do processo”, relatou Patrícia.

Os brinquedos foram elaborados a partir de traços e fenótipos da população afro-brasileira. Para as crianças, o desafio era recriar a si mesmas por meio dos bonecos e bonecas, e, no decorrer do processo, a escolha do tom de pele era essencial para assemelhá-lo ao seu dono, buscando o reconhecimento de suas cores.

“Começamos a elaboração dos bonecos por conta do legado que conhecemos de inexistência ou negação dos corpos negros representados a partir dos brinquedos. Houve aluno que se negou a aceitar seu tom de pele. Dizia que sua palma da mão era branca e, por isso, seu boneco seria branco como ela. No final da oficina, descobrimos que ele era o único negro entre três irmãos e entendemos o porquê do processo”, relatou Patrícia.

Na Esdep, a palestrante caracterizou o convite como surpreendente e desafiador. Para ela, os idosos que representam hoje a masculinidade existente foram criados de forma rigorosa. “Eles tiveram a infância negada, por isso, tivemos a necessidade de criar bonecos que representassem essa população de homens negros”, completou.

Políticas Públicas 

A psicóloga clínica e co-fundadora da rede Dandaras, Laura Augusta, também mediadora da roda de conversa, lembrou que dialogar sobre o tema masculinidades é também pensar em como as políticas públicas atuam com relação aos homens. “Sabendo que a maioria da população de rua é masculina e negra, existe a necessidade de fazer essa discussão. Profissionais de atuação e pessoas que acabam transitando por esse espaço precisam ser politicamente formadas em questões de gênero, de classe e de raça”, completou.

O mestre em Psicologia Social, atuante na Central Integrada de Alternativas Penais, Djean Ribeiro, destaca que homens majoritariamente negros sofreram com ausências relacionadas à escolaridade, o que os leva  à inserção muito precoce no mercado de trabalho informal. “A conjuntura é muito complexa. Os condicionantes sociais que provocam a construção desse homem serão atravessados por questões de violência, brutalidade e falta de afetividade. E isso reforça o lugar de homem, sobretudo negro, ao local de suspeito, violento e potencial agressor, privando-o de ampliar as possibilidades de construção dessa masculinidade, provocando para ele subserviências, nulidades e anulações”, explicou.

O evento contou com comentários dos participantes idosos, que se sentiram seguros em dialogar sobre o tema. Ao final da roda de conversa, a pedagoga Patrícia Santos Silva avaliou o momento. “Saio daqui com o sentimento de missão cumprida. As discussões sobre masculinidade ainda são poucas, mas entendemos que o que estamos aprendendo hoje é o início de uma grande caminhada. Espero que daqui a cinquenta anos essas crianças possam ter outra fala com relação à representatividade na infância”, finalizou.