COMUNICAÇÃO
O que muda para a Defensoria Pública após o julgamento da prerrogativa de requisição no STF?
Por 10 votos a 1, ministros do supremo reconheceram que a instituição tem função essencial para a manutenção do regime democrático e acesso à cidadania. Especialistas apontam os caminhos de atuação após essa vitória.
O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) manteve a prerrogativa da Defensoria Pública de requisitar de autoridades e agentes públicos certidões, exames, perícias, vistorias, diligências, processos, documentos, informações, esclarecimentos e demais providências necessárias à sua atuação. A decisão majoritária se deu na sessão virtual do julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 6852, em que o procurador-geral da República, Augusto Aras alegava que disposições da Lei Complementar 80/1994 (que organiza e prescreve normas gerais a Defensoria Pública da União do Distrito Federal e dos estados) confere aos defensores públicos esse poder, que advogados privados, em geral, não detêm e isso feriria o princípio da isonomia.
O relator Edson Fachin votou pela improcedência da ação, argumentando que a Defensoria Pública exerce uma função essencial à Justiça e à democracia, especialmente no que diz respeito à sua atuação coletiva e fiscalizadora. O relator salientou que a Defensoria Pública não deve ser equiparada à advocacia, pública ou privada, e que as funções desempenhadas pelo defensor público e pelo advogado não se confundam. Para Fachin, sua atuação está mais próxima do desenho institucional atribuído ao próprio Ministério Público. A ministra Carmen Lúcia foi a única a divergir, afirmando que a prerrogativa contida na lei só poderia ser usada pela Defensoria Pública em processos coletivos, mas não deveria ser permitida em ações individuais.
Alguns especialistas sinalizaram como marco histórico a vitória da prerrogativa de requisição. A presidenta da Associação Nacional das Defensoras e Defensores Públicos (ANADEP), Rivana Ricarte, reconheceu a importância de posicionamentos dos ministros em relação as Defensorias Públicas no julgamento da ADI 6852 . “Os votos dos Ministros Fachin, Alexandre de Moraes, Gilmar Mendes e Nunes Marques reafirmaram pontos importantes que sustentamos nas ações e garantindo o fortalecimento da instituição. Seria um retrocesso para a atuação constitucional da Defensoria Pública e a adequada prestação do direito fundamental à assistência jurídica integral à população mais vulnerabilizada”. Estellamaris Postal, a presidenta do Colégio Nacional dos Defensores Públicos-Gerais (Condege), celebrou a união de forças diante do julgamento. “Essa vitória representa o fortalecimento da Defensoria Pública como instituição unificada em suas defesas e essencial para que a Justiça seja realmente para todos. Conseguimos mostrar que a Defensoria Pública atua unida e focada em sua missão constitucional. Isso, sem dúvida, vai ser histórico para o Condege e para as Defensorias Públicas.”
O Defensor-Geral da Bahia, Rafson Ximenes, acredita que o julgamento foi um marco histórico na atuação das Defensorias, pois levantou a perspectiva que a sociedade começasse a debater a função social da instituição e entender os serviços que ela oferece à população. “A Defensoria saiu muito mais forte e com muito mais responsabilidades deste julgamento. A nossa responsabilidade aumenta quando a população reconhece o seu direito ao acesso à justiça e a cidadania através da Defensoria”. Ximenes ainda evidencia o papel da DPE-BA neste processo: “A Bahia foi decisiva no julgamento ao apontar dados, números e histórias reais das pessoas atendidas. Ao mesmo tempo, conseguimos demonstrar que existe uma vida real, uma importância do trabalho das Defensorias no dia-a-dia das pessoas, e a sua dimensão através das estatísticas e isso sim é decisivo.”.
O julgamento foi amplamente divulgado pelos grandes veículos da imprensa e debatido nas redes sociais por figuras públicas como Daniela Mercury e Juliette. Essa visibilidade atraiu os olhares da sociedade para os papéis das Defensorias Públicas para a sociedade brasileira e reverberou por todo judiciário no Brasil. Domilson Rabelo, Defensor-Geral de Goiás, acredita que essa vitória apresenta reflexões importantes para dentro e fora da instituição. “Sem dúvida, teremos mais responsabilidades com o fortalecimento da nossa instituição, tanto com as pessoas que utilizam o serviço quanto com o Sistema de Justiça. Essa vitória nos faz refletir sobre o papel e a abrangência do amparo legal e integral da população e a necessidade de um órgão que represente nacionalmente o trabalho unificado das Defensorias Públicas”. Já o ex-ministro da Justiça, Eduardo Cardozo, comemorou a vitória da prerrogativa. “A defensoria pública, a cada dia, tem tido reconhecida a sua importância e o seu importante papel no nosso Estado Democrático de Direito. Essa decisão expressa esse resultado. Parabéns a todos os defensores públicos do país!”.