COMUNICAÇÃO
Perfil dos assistidos da Defensoria Pública é debatido por sociedade civil em audiência pública
"É um encontro muito forte. Essa é a fotografia linda que mostra a diversidade da sociedade baiana", disse a ouvidora-geral Vilma Reis ao se referir às pessoas que compareceram à Audiência Pública que discutiu os critérios de definição do perfil dos assistidos da Defensoria Pública do Estado da Bahia – DPE/BA, na tarde dessa terça-feira, 22. Solicitado pela Ouvidoria da instituição, o debate aconteceu no auditório da Escola Superior da DPE/BA – Esdep com a presença de representantes de movimentos sociais, de movimentos trabalhistas, artistas locais e sociedade civil que criticaram a adoção da pobreza financeira como regra para o atendimento prestado pela Defensoria Pública.
Compondo a mesa de abertura da audiência, o defensor público geral da Bahia, Clériston Cavalcante de Macêdo, destacou a importância do diálogo com o usuário dos serviços da instituição para a tomada de uma decisão amadurecida e responsável. "As dificuldades precisam ser ditas olho no olho de forma que possamos nos ajudar mutuamente", disse o defensor-geral ao pontuar as limitações da DPE/BA, que incluem a redução de 24 milhões no orçamento e o déficit de defensores públicos em todo o Estado. "Gostaria que, de forma muito amadurecida, saísse uma proposta factível que embasasse a decisão do Conselho Superior. Precisamos compatibilizar a necessidade com a possibilidade", ponderou Clériston de Macêdo.
A Resolução 003/2014, suspensa no dia 07 de julho de 2015, define que o assistido pela Defensoria Pública não deve receber mais do que 2.046,38 reais para que seja declarado hipossuficiente. Definição essa que foi amplamente criticada durante a audiência pública. Para o diretor regional da Associação Brasileira de ONGs (Bahia e Sergipe), Damien Hazard, a pobreza financeira é uma das dimensões da vulnerabilidade, mas não a única. "Percebe-se que os governantes conseguiram implementar uma política de diminuição da pobreza financeira, através da transferência de renda, com os programas sociais como o Bolsa Família, mas a violência continua. Nós temos um conceito pobre sobre o conceito de pobreza", embasou.
Assim é o caso da mãe de Ivana Chastinet, representante do Movimento "Nosso Bairro é 2 de Julho" e moradora do bairro Vila Coração de Maria, que, aos 80 anos, ganha mais de 2.046 reais, no entanto, chega a gastar mais de 50% da renda por mês com remédios. "Se a resolução estivesse em vigor, inviabilizaria o atendimento pela Defensoria", contou. Chastinet apontou ainda a necessidade de mais discussões, inclusive, com consulta pública, que traria também o posicionamento de outros órgãos e instituições do governo, para que se possa chegar a um encaminhamento responsável. "É uma decisão com a qual lidaremos para todo o tempo', complementou. O resultado da audiência pública servirá como embasamento para a decisão do Conselho Superior da DPE/BA acerca da definição dos critérios objetivos de acesso ao sistema de serviços oferecidos pela Defensoria.
CRITÉRIOS DE ESCOLHA
Defensora pública há 15 anos, Fabiana Miranda comparou a atuação da Defensoria Pública sem a Resolução 003/2014, quando ficava somente a critério do membro a identificação da hipossuficiência ou não do cidadão. Ainda de acordo com ela, que hoje coordena a equipe multidisciplinar de atendimento às pessoas em situação de rua da DPE – Equipe Pop Rua, nunca aconteceu de um cidadão ficar sem a assistência da Defensoria, ainda que a renda ultrapassasse o previsto na regulamentação. "Tentávamos descobrir se o assistido podia pagar um advogado ponderando a renda com as despesas do cidadão", contou. Para ela, a resolução passou a prejudicar as pessoas que precisam utilizar os serviços da instituição. "Me parece que o cidadão vai precisar de um defensor público para ter acesso à instituição", criticou a defensora pública.
Ao considerar a audiência pública uma vitória da gestão do defensor-geral, Clériston de Macêdo, a ex-ouvidora-geral da DPE/BA, Tânia Palma, apontou os desafios para a construção desses critérios, uma vez que, segundo ela, a Defensoria ainda não se consolidou como instituição pública. "A Defensoria precisa dizer que tem uma demanda que sai pela janela e que precisa ser ampliada. O critério não traz qual é a eficiência e eficácia do serviço. Ela precisa apresentar uma demanda real e não é você negando o acesso que você apresenta. O acesso tem de sair pela janela para você mostrar aos governantes que se trata de uma instituição necessária da qual as pessoas tem pertencimento", afirmou.
PARTICIPAÇÃO POPULAR
A estudante de Direito da Uneb Franciane Andrade Santos, 23 anos, considerou o debate uma iniciativa diferente por reunir defensores públicos e o defensor público geral com representantes da sociedade civil. "É um processo de inclusão e diversidade", observou. Por se tratar de um critério subjetivo, a estudante acredita que a solução é não utilizar critério para definir os assistidos da Defensoria Pública. "Um bom exemplo é o de uma mulher que sofre violência doméstica. O marido ganha bem, ela não trabalha e é dependente dele. Ela não pode ser uma assistida da DPE por isso? Se, além de vulnerável, como ela vai lutar contra sua fonte de renda? ", questionou.
Estudante de gestão pública e representante da comunidade "Guerreira Zeferina", conhecida como "Cidade de Plástico", em Periperi, Wilson Nunes compareceu à audiência pública para explanar a situação do local, onde as mulheres da comunidade não recebem atendimento por não possuírem CEP e há sempre investidas da polícia contra as famílias que ali vivem. "Essa é uma nova concepção de uma Defensoria Pública mais próxima das pessoas. Estou aqui para fortalecer a luta pelas pessoas que precisam da assistência da instituição", declarou.
A AUDIÊNCIA
A Audiência Pública foi solicitada pela Ouvidoria-Geral da DPE/BA, após o Conselho Superior da Defensoria Pública do Estado da Bahia – CSDPE deliberar por decisão da maioria, no dia 7 de julho do ano em curso, na 169ª sessão extraordinária do CSDPE, pela suspensão integral e imediata da Resolução 003/2014, do Conselho Superior, que trata dos critérios objetivos para ser atendido pela Defensoria Pública.