COMUNICAÇÃO

"Prender mais no Brasil não é a solução mais inteligente", defende conselheiro do CNPCP

14/06/2016 14:05 | Por CAMILA MOREIRA DRT 3776/BA (Texto e fotos)
Defensor público de São Paulo, Renato Campos de Vitto falou sobre o tema durante evento "Integrando o Pacto pela Vida: Segurança Pública e Justiça Criminal"

Prender mais no Brasil não é a solução mais inteligente para resolver o problema da criminalidade. É o que afirmou o defensor público de São Paulo e conselheiro do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária – CNPCP, Renato Campos de Vitto, durante o evento "Integrando o Pacto pela Vida: Segurança Pública e Justiça Criminal", realizado nesta segunda-feira, 13. De acordo com De Vitto, "houve um aumento de quase 600% na taxa de aprisionamento no país da década de 90 até 2014. E isso não nos trouxe sensação de segurança".

O ex-diretor Geral do Departamento Penitenciário Nacional afirmou ainda ser preciso caminhar para encontrar um arranjo que dê conta das manchas de violência. "Precisamos reconhecer que temos um problema. Construir o papel de um porta voz com liderança e buscar integração das diferentes instituições. São 60 mil homicídios por ano no país com a quarta maior população carcerária do mundo. Evidente que a gente vive uma tragédia social, mas não podemos tratar isso como numa guerra. Nela, o objetivo é anular o inimigo. No Brasil, vivemos num Estado Democrático de Direito", pontuou.

As informações apontadas pelo DEPEN confirmam a problemática situação prisional, marcada por superlotação, celas sem condições de higiene, presídios dominados por facções criminosas e desafios para a chamada "ressocialização" do indivíduo. Em dezembro de 2014, o número de pessoas privadas de liberdade no Brasil chegou a 622.202. Em dezembro de 2013, eram 581.507, o que mostra que a população carcerária aumentou 7% em um ano (40.695 detentos a mais). Cerca de 40% dos presos brasileiros são provisórios, ou seja, ainda não foram julgados em primeira instância. Mais da metade da população carcerária é formada por negros, e o tráfico de drogas foi o crime que mais levou os detentos à prisão. Pelo levantamento de 2015, o Brasil tem a quarta maior população penitenciária do mundo, atrás dos Estados Unidos (2,2 milhões, ano de referência 2013), China (1,65 milhão, ano de referência 2014) e Rússia (644.237, ano de referência 2015). Já o déficit de vagas chega a de 250.318.

Para De Vitto, a variação de quase 600% no número de prisões em pouco mais de 20 anos demonstra que é preciso prender melhor, sobretudo a partir de um trabalho de inteligência das polícias com foco nos crimes organizados e chefes de facções. "Se o número alto do encarceramento trouxesse melhores indicadores, pensaríamos que tal medida está valendo a pena. O que não é o caso. Todos os indicadores de criminalidade são piores hoje se comparados aos do passado", sentenciou.

INTEGRANDO O PACTO PELA VIDA

Com objetivo de aprofundar a integração dos profissionais que atuam em prol do Sistema de Justiça Criminal no Estado da Bahia, no âmbito dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, do Ministério Público e da Defensoria Pública, o encontro Integrando o Pacto pela Vida: Segurança Pública e Justiça Criminal reuniu defensores públicos, juízes, promotores, agentes da segurança pública e representantes da Secretaria de Justiça, Direitos Humanos e Desenvolvimento Social e Assembleia Legislativa. À tarde, o subdefensor público geral, Rafson Ximenes, falou sobre a importância do trabalho diverso, porém essencial, de cada instituição integrante no pacto. "Estamos reunidos hoje aqui para falar sobre um pacto, um pacto que não é pela pena, nem pela prisão, mas sim pela vida. Uma forma de trabalharmos é fazer com que todos os atores envolvidos, mesmo representando missões diferentes – como é o caso da Defensoria, do Ministério Público e da Justiça, apresentem suas propostas. Um pacto precisa ter respeito. Entender a atuação e função de cada um, bem como sua importância na solução dos conflitos é fundamental", destacou.

Para o defensor público Fábio Martinez, de Paulo Afonso, o evento apresentou um ponto de vista diferente daquele que normalmente está acostumado quando participa de reuniões que discutem a segurança pública localmente. "Estamos muito acostumados a debater os efeitos, mas pouco discutimos sobre as causas. A fala de De Vitto traz exatamente a problematização da questão. Até que ponto a política carcerária adotada é solução para a situação caótica vivida no país?", questionou. Para Martinez, a política de encarceramento não resolve o problema, mas, apenas, oferece uma resposta imediata a uma demanda da sociedade em relação a impunidade.

A defensora pública Carolina de Araújo, da Especializada Criminal, concorda. Segundo Carolina, para os crimes onde não envolvem violência alguma, a prisão é algo pernicioso. "A prisão segrega, não oferece oportunidade. Existem formas de punição que não são necessariamente prisões, como as sanções administrativas, pecuniárias, de privação de diretos políticos. Elas são mais eficientes e menos caras", defende.

Em Irecê, a presença de presos provisórios em delegacias, por não haver unidade prisional, também é um problema enfrentado pela Defensoria. De acordo com a defensora pública Mércia Patrocínio a delegacia da cidade atende presos provisórios, não só de Irecê, mas também de municípios vizinhos, embora apresente situação de completa insalubridade Com capacidade para 50 presos, a unidade abriga hoje 83 pessoas.

Já a importância das audiências de custódia foi reafirmada pelo defensor público Alessandro Moura. "A partir das audiências de custódia você qualifica as prisões, porque consegue indicar os elementos que justifiquem uma medida cautelar excepcional, que é a prisão. Além disso, a audiência de custódia é importante para evitar o abuso, o excesso na atuação policial. Ela só traz benefícios", afirmou.

Segundo Moura, pelos dados da DPE não há comprovação de que mais pessoas são soltas com as audiências. "Obviamente se consegue apurar e aplicar medidas cautelares diversas da prisão, como comparecimento periódico em juízo, por exemplo. O número de reincidência daquelas pessoas que recebem penas alternativas às de privação de liberdade é inclusive, extremamente baixo", revelou.

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