COMUNICAÇÃO

Presa em regime fechado consegue na Justiça direito de cursar semestre na UFBA após ação da Defensoria

02/09/2020 15:23 | Por Júlio Reis - DRT/BA 3352 | Foto: TJMT

A decisão vai ao encontro da compreensão do princípio da ressocialização e reeducanda já está autorizada a cursar no turno diurno o semestre que será ministrado remotamente

Custodiada em regime fechado no Conjunto Penal Feminino de Salvador, Iara Margarida* finalmente poderá iniciar o curso de graduação na Universidade Federal da Bahia – UFBA, onde foi aprovada em 2018. Após ação movida pela Defensoria Pública do Estado da Bahia – DPE/BA, a Justiça concedeu nesta segunda-feira, 31, autorização para que ela curse, no turno diurno, o semestre suplementar da UFBA a ser ministrado remotamente (por vias virtuais) a partir do dia 8 de setembro.

Na decisão favorável à solicitação da Defensoria, a juíza Maria Angélica Carneiro, da 2ª Vara de Execuções Penais, assinalou que o direito à educação está associado à dignidade da pessoa humana e que entre os objetivos da execução penal estão a criação de condições que possibilitem a reinserção dos sentenciados à sociedade.

Para a defensora pública Andrea Tourinho, autora do pedido atendido, a decisão vai ao encontro da compreensão do princípio da ressocialização. “Ressocializar é ficar enclausurado? Não. É justamente oferecer mecanismos para que o preso possa melhorar sua situação, que ele tenha acesso, entre outras coisas, ao trabalho e ao estudo”, explicou.

Segundo a defensora pública, em que pese a omissão da lei de execução penal em garantir aos presos em regime fechado a possibilidade de usufruir do acesso ao direito de trabalhar ou estudar, já há inúmeros casos no Brasil de presos que obtiveram na Justiça acesso ao exercício destas atividades mesmo externamente aos limites da prisão.

O empenho da Defensoria para assegurar que Iara Margarida possa frequentar as aulas como estudante regular da UFBA é constante e já contou com o esforço anterior dos defensores Pedro Bahia, Cláudio Piansky e Rebeca Silva.

A decisão em favor de Iara Margarida* até aqui, no entanto, lhe garantirá a presença no semestre complementar da UFBA porque ele está sendo ofertado de maneira remota (por via virtuais) e, após solicitação prévia da Defensoria, Conjunto Penal Feminino atestou a presença de local e equipamento que viabilizavam o acesso dela ao estudo por aulas à distância.

“Vamos atuar no sentido de garantir e manter a continuidade do estudo dela, quando o ensino voltar a ser presencial. A ressocialização não tem volta. É preciso se pensar sempre na progressão de melhora de vida e condições para o interno. Se o preso já conseguiu avançar por que ele deve parar?”, pontua Andrea Tourinho.

História de superação

Com 36 anos, Iara Margarida foi condenada a 25 anos de prisão, dos quais já cumpriu pouco mais de nove anos. Andrea Tourinho diz, por outro lado, que com a defesa da Defensoria pela amplitude da remição de pena – dispositivo que permite ao preso abater dias da sentença conforme práticas de certas atividades – para estudo e leitura de livros, Iara Margarida poderá alcançar a progressão da pena antes de 2024.

Com uma história de vida marcada por abusos, ausência de direitos e vulnerabilidade social que a conduziram à práticas criminais, Iara Margarida passou dentro do presídio a se dedicar aos estudos fazendo cursos e sendo uma das mais assíduas frequentadoras da biblioteca. Foi aprovada em 2018 no curso de Biblioteconomia da UFBA após realizar o Exame Nacional do Ensino Médio e obter pontuação que a qualificava para o ingresso na Universidade.

O fato foi apontado pela Defensoria e não deixou de ser destacado pela decisão judicial: “merece salientar que em pleno cárcere, a reeducanda logrou êxito na aprovação de um dos processos vestibulares mais concorridos, garantindo sua matrícula em uma das melhores instituições de ensino superior do país, algo que muitos jovens, em que pesem terem a seu favor todas as vantagens que a vida longe do cárcere lhes proporciona, não conseguem”.

*nome fictício