COMUNICAÇÃO

Presidente da ANADEP faz balanço de 2007

01/01/2008 14:51 | Por

O Ano!

Prezados colegas,

Estamos encerrando mais um ano de trabalho. Ano em que muitos acontecimentos se sucederam como uma gangorra, variando do positivo ao negativo sem escrúpulos.

Vivemos todos os tipos de emoções e fomos revelados como uma instituição que não precisa só de apoio para se fortalecer, mas de cuidado político para não avançarmos sobre ranços históricos, incrustados no conservadorismo dos que vivem para manter o estado das coisas como estão.

Foi o ano que perdemos a nossa inocência. Hoje, ao entabularmos uma conversa política, lamentavelmente o interlocutor desconfia de quanto estamos pedindo.

Foi o ano em que nossa realidade passou a se traduzir em números e a nossa cultura orçamentária revelou-se na sua inteireza. Assim, para falarmos objetivamente sobre Defensoria Pública, obrigatoriamente temos que repassar a nossa realidade orçamentária. Sem orçamento digno não há ideologia que se sustente, muito menos avanços institucionais efetivos.

No entanto, ao avançarmos sobre o bolo, geramos a reação dos que há tempos são convidados para a festa. O bolo continua o mesmo e qualquer movimento consistente gera uma disputa pelo maior pedaço.

Triste constatação, porém real. Não vivemos no mundo que queremos e o comportamento humano a cada dia parece ser mais irracional. A visão é periférica, não se produz nenhum sentido holístico, não se comparte, não se aglutina. Cada um com os seus problemas, ilhados. E se trata da coisa pública submetida aos diversos interesses privados!

No ano, os nossos números também foram contados com aumento real em subsídios (ou vencimentos) em alguns Estados. Contudo, não como gostaríamos. De fato, tivemos consideráveis avanços, o que sempre nos coloca em evidência. Bom? Claro! Precisamos avançar e conscientizar o poder político de que um bom salário atrai melhores profissionais, que servirão melhor à população.Não é das tarefas mais fáceis!

Crescendo, estamos encontrando colegas que estão na instituição por sua boa remuneração, renegando qualquer elemento vocacional. Que ironia! Isso também é real e como já não vivemos mais na inocência temos que aprender com isso: sempre atrás do bônus vem embutido o ônus.

Foi o ano em que pudemos presenciar a posse de quase oitocentos novos defensores públicos. Cremos que seja um acontecimento inédito e que aponta o caminho que estamos seguindo. As mudanças institucionais, desde 2005, são impressionantes. Merecemos já a realização de um III Diagnóstico para aprendermos com essas mudanças.

Reconhecer-nos é condição para um passo firme e seguro. Nesse sentido, louve-se o trabalho que está sendo realizado pelo Condege. Precisamos de visão estratégica e gerencial, além da disseminação da boa prática e da avaliação dos resultados. A ignorância nos mantinha misotrópicos.

Esse foi o ano das mulheres que se destacaram na política institucional e estão ocupando com destaque um lugar na história da nossa instituição. Hoje, a Defensoria-Geral está sob o comando de treze mulheres nos seguintes Estados: RS, SP, ES, MT, MS, TO, BA, PE, CE, MA, PA, AM e AC. Boa parte é egressa das Associações Estaduais, onde militavam pelo fortalecimento da instituição. Isso é mais do que sintomático, é uma realidade em consonância com um grande numero de mulheres que são assistidas diariamente pela Defensoria Pública. Número significativamente maior do que os homens. As mulheres são mais práticas e objetivas, traduzem melhor os sentimentos. Devemos render homenagens a essa coragem e determinação.

O ano começou com grandes expectativas políticas e se revelou frustrante. Pautamos a nossa PEC no Plenário da Câmara e lançamos o nome do nosso brioso colega José Augusto Garcia para concorrer ao cargo de Conselheiro do Conselho Nacional de Justiça na vaga destinada à sociedade civil a ser indicada pela Câmara. A PEC foi atropelada pelo calendário político de um ano, infelizmente, pouco produtivo para a Câmara dos Deputados, sempre envolvido com medidas provisórias que constantemente trancavam a pauta ou com discussões estéreis (como foi o caso da CPMF, que tomou muitas semanas nesse segundo semestre).

De qualquer forma, a tramitação no Plenário da PEC 487 expôs publicamente pretensões que nem sempre comungávamos, o que tornou difícil o discurso em sua defesa. Sempre soubemos que ela era muito grande e pesada, o que poderia ser objeto de negociação para preservar os nossos pontos estruturais. Mas não foi assim que ocorreu. Na negociação pedimos muito para retirar a gordura e o Governo respondeu com a PEC 144, preservando, inexplicavelmente, grande parte do que rejeitávamos. Talvez, se tivéssemos começado com alguma coisa mais modesta, não estaríamos agora alimentando discurso oportunista contrário a nossa causa.

O importante, porém, foi que tínhamos uma bandeira e movimentamos bastante o Congresso Nacional esse ano. Foram muitos colegas que se mobilizaram e vieram a Brasília. Chegamos a ter cerca de oitenta defensores em um único dia no Congresso Nacional. Essa mobilização foi essencial. Fomos notados, exaltados e, também, logicamente, como decorrência, esculachados. Na guerra é assim: quem se levanta para atirar se sujeita a levar um tiro. De qualquer forma, em fevereiro começa tudo de novo.

Aliás, foi um ano de muitos tiros. Ainda comemorando e empolgados com a recém sancionada Lei nº 11.448/07, a Associação dos Membros do MP (Conamp) propõe uma Adin contra nossa legitimidade para ação civil pública. Reagimos de imediato! Houve uma comoção nacional! Recolhemos vários trabalhos realizados nos então nove meses de vigência da lei. Apresentamos uma defesa ao STF que é memorável, com a inestimável participação do nosso advogado Pierpaolo da Cruz Bottini e do nosso colega especialista em ACP, José Augusto Garcia.

Pela reação dos colegas em todo Brasil, foi interessante observar como muitos estão ligados em nossas prerrogativas e cientes de que a utilização de um instrumento moderno para solução de conflito judicial não pode ficar com exclusividade em uma única instituição. Tenho certeza que vamos ganhar! O STF está muito sensível às nossas causas e os ministros sabem que somos muito poucos para atender muita gente, para abrir mão de um avanço processual.

De toda forma, vale o registro da conscientização da utilização das ACP's, o que nos primeiros meses de vigência da lei tinha se demonstrado um pouco tímida. A qualidade das ações que recebemos dos colegas em Brasília é de encher qualquer um de orgulho. Parabéns a todos que se empenharam em mais essa luta. Parabéns pela consciência alcançada, porquanto as ações guardavam em si uma grande responsabilidade na sua postulação. Essa responsabilidade fez a diferença!

Ainda sobre tiros, de forma inconcebível, o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) se posicionou contra a nossa PEC e a reforma da Lei 80 pelo PLP 28/07. Ora, como se não bastasse a adin, agora teria que haver um "estudo" sobre a nossa legitimidade, como doença contagiosa que merece ser tratada com a prevenção. Tal postura é absolutamente esdrúxula e estranha à função de controle externo da atividade do Ministério Público, a que cabe a esse Conselho.

Na semana anterior havia o CNMP se manifestado contra um projeto para regulamentar o inquérito civil público, que passaria a contar com prazo para a sua conclusão e controle judicial, assim como o inquérito policial. Desse modo, parece que o Conselho está fazendo controle externo da atividade da Polícia e da Defensoria Pública, contrariando a sua missão institucional. Não tardou a reação do Congresso! A Comissão de Constituição e Justiça da Câmara aprovou, por goleada, o Decreto Legislativo que suspende a resolução do CNMP que se auto concedia poder investigativo. Nunca antes tínhamos visto o Ministério Público com tão pouco apoio político. Os tempos estão duros e tenho certeza que essa briga com a Defensoria Pública vai desgastar ainda mais a imagem do Ministério Público, infelizmente.

Devemos sempre salientar que existem valorosos membros do MP que já se manifestaram contrários a esse entendimento conservador e inútil, revelando-se acima de qualquer contenda corporativa, para a preservação do interesse público. Continuamos entrando com ações em litisconsórcio ativo, o que é um ato de coragem e de independência. Aliás, a esse público que atendemos não interessa quem propõe as ACP's, desde que sejam efetivamente propostas para proteção de seus interesses. Nada mais!

Quanto à defesa das nossas funções institucionais, o ano também nos trouxe muitas surpresas. Fomos atingidos em cheio pelo o indescritível fato ocorrido com uma menina de 15 anos em uma cadeia pública de Abaebetuba, no Pará. Havia cinco defensores públicos na comarca. O flagrante foi regularmente comunicado à Defensoria Pública, que infelizmente não tomou nenhuma providência, nos colocando ao lado do Ministério Público, da Polícia Civil e do Judiciário como co-responsáveis pelo acontecimento. É essa a conclusão que alguns membros da CPI do Sistema Carcerário vêm declarando aos jornais, o que significa, segundo informações de vários deputados federais que ouvimos, que todos serão indiciados pela terrível omissão.

Longe de querer fazer juízo de valor da conduta da colega defensora responsável pelo recebimento da comunicação do flagrante (fato que está sendo apurado por processo administrativo imediatamente instaurado pela Defensoria-Geral do Estado), o certo é que a assunção de novas funções institucionais como a da comunicação imediata do flagrante, previsto pela Lei nº 11.449/07, traz novas responsabilidades funcionais. Devemos sempre refletir o que estamos fazendo e principalmente o que não estamos. Só nos resta tirar algo de pedagógico desse lamentável acontecimento: para continuarmos a crescer vamos sempre ter que assumir novas responsabilidades. Outras muitas virão e não poderemos tratar os assuntos de forma burocrática, sob pena de pagarmos um enorme preço.

Na mesma esteira da dificuldade de agenda política, não conseguimos ainda aprovar o PLP 28 na Comissão de Administração, Trabalho e Serviço Público da Câmara dos Deputados. O PLP 28 foi distribuído em março para o Deputado Eduardo Barbosa (PSDB/MG). Durante esse período fizemos várias reuniões, inclusive uma AGE para apresentarmos propostas a serem acrescidas ao projeto encaminhado pela presidência da República.

Feito assim, o projeto que inicialmente só tratava da parte geral e da regulamentação das DPE´s recebeu muitas emendas da DPU, que não quis encaminhar anteriormente a reforma junto com o nosso projeto. Fizeram, então, um projeto próprio que ainda não saiu do Executivo. Com o encaminhamento do PLP 28 (estamos trabalhando nesse texto desde 2004), a DPU achou oportuno apresentar várias emendas, só que não mais de caráter normativo geral, mas especial, conforme determina a Constituição. Essa foi a principal causa do atraso na tramitação do projeto.

Recentemente, e democraticamente, recebemos o pré-relatório para podermos nos manifestar. Em reunião realizada em Belo Horizonte acertamos com o relator a volta de várias funções institucionais que haviam sido, inexplicavelmente, retiradas. A reunião foi muito produtiva e estamos apostando no caráter humanista do Deputado. As emendas sugeridas pela AGE foram adotadas e a idéia era a votação do relatório no ultimo dia 19 de dezembro. Mais uma vez o calendário não permitiu e ficou adiado para a primeira semana útil de fevereiro. Vamos ter que nos mobilizar nacionalmente!

Ainda esse ano, democraticamente, participamos da campanha do nosso colega José Augusto ao CNJ, e democraticamente perdemos. A campanha foi muito produtiva e nos permitiu ocupar um espaço que outra instituição ocuparia sem a nossa participação. A eleição ficou entre dois candidatos, o que permitiu a partidarização da disputa: ou seja, governo e oposição. Como o outro candidato foi apoiado pelo presidente da Câmara, nos restou a oposição e alguns Deputados aliados. Resultado: 1/3 de votos para José Augusto e 2/3 para o vencedor.

Existe também um caráter pedagógico nesse resultado. A mais relevante é que precisaremos sempre de apoio do governo para pretender qualquer avanço na legislação, seja constitucional ou não. O que aconteceu no dia 17 de outubro de alguma forma foi o que aconteceu na eleição do CNJ, embora naquele triste dia não tenhamos chegado a votar. A outra, é que uma mobilização constante é questão de sobrevivência política.

Participamos durante o ano de vários projetos, entre eles a criação do Fórum Nacional das Carreiras Típicas de Estado, uma associação composta por 25 entidades (as maiores do setor público), para trabalharmos juntos contra qualquer pretensa reforma no Estado e na previdência social, em detrimento dessas carreiras. Somos fundadores e estaremos presentes em todas as reuniões defendo os nossos interesses.

Nessa semana, participamos mais uma vez da cerimônia de premiação do Innovare, que agora vai virar um instituto. Temos sempre que inscrever projetos e participar! É, com certeza, o maior acontecimento jurídico do ano. Parabéns aos colegas de MT e da BA que tiveram os projetos premiados esse ano. A simplicidade deu o tom e a possibilidade de exportar os projetos para outros Estados é significativamente importante para a escolha do projeto premiado. Cabe ao Condege o intercâmbio dessas boas idéias e práticas, para que possamos inovar sempre e prestar um serviço público mais eficiente e moderno.

O ano que chega promete muito trabalho. Já acertamos a criação de uma Frente Parlamentar de Apoio à Defensoria Pública, que provavelmente lançaremos em fevereiro. Faremos audiências públicas em vários Estados para fortalecermos sempre a instituição e, por conseguinte, valorizarmos cada vez mais o defensor público. Vamos fazer também um abaixo-assinado nacional para colhermos, no mínimo, 1.000.000 (um milhão) de assinaturas em favor da nossa causa. Detalhes passaremos em breve.

Vamos precisar da participação de todos, do empenho e das idéias. Não subestime a sua capacidade de opinar e trazer boas sugestões, principalmente pelo fato de estar lotado em uma comarca distante. Ao contrário, na medida do possível, temos respondido aos inúmeros e-mails que chegam apresentando sugestões, criticas ou mesmo fazendo um comentário ou tirando uma dúvida.

Também, na medida do possível, estou encontrando os colegas onde estão lotados, para conhecer a sua realidade e ouvir opiniões. Essa participação é vital. Só assim conseguiremos sempre fazer um juízo crítico mais apurado e redirecionar corretamente o rumo da nossa política institucional. Estamos sempre à disposição e abertos para todos!

Que o ano que chega possa realizar todos os nossos sonhos, permitindo o fortalecimento cada vez maior da nossa instituição.

Obrigado a todos que me receberam muito bem por todo o Brasil! Foram momentos relevantes e inesquecíveis! Perdoem, no entanto, as minhas limitações.

Grande abraço,

Fernando Calmon

Presidente da ANADEP

Fonte: Site da ANADEP