COMUNICAÇÃO

Prisão por uso de drogas é política de exclusão, afirma defensor

21/10/2013 22:36 | Por

O último painel temático do I Encontro Baiano de Defensores em Direitos Humanos propôs uma discussão em torno da abordagem do uso de drogas como uma questão de Direitos Humanos e não Criminal. Intitulada de Substâncias Psicoativas e Direitos Humanos, a palestra foi ministrada pelo diretor da Escola Superior da Defensoria Pública (ESDEP), Daniel Nicory.

Em sua fala, o defensor criticou a Lei de Drogas que, segundo ele, é bastante ampla na incriminação por tráfico e vaga na delimitação do que seria o traficante, o que justificaria ter ocorrido uma explosão carcerária por crime de tráfico mesmo depois de aprovada a Lei. "Tem gente sendo presa a rodo no Brasil por acusações de tráfico que, na verdade, possuíam quantidades ínfimas de drogas no momento da prisão", denuncia.

De 2006 a 2012, o número de presos por tráfico na Bahia subiu de 1.319 para 3.440. No entanto o aumento total da população carcerária foi bem menor, passou de 12.891 para 13.105. Os dados são do Sistema de Informações Penitenciárias do Ministério da Justiça. Segundo números preliminares do Observatório da Prática Penal da ESDEP, na maioria das prisões em flagrante por tráfico, ocorridas no primeiro semestre dos anos 2011 e 2012, o detido possuía menos de 5g da substância. O fenômeno foi observado em 25,28% dos 178 casos das prisões por porte cocaína e em 25,17% de 298 prisões dos que portavam crack.

Política de exclusão - Na visão do diretor da ESDEP, a prisão "indiscriminada" de usuários caracterizados como traficantes é uma política escancarada de exclusão da juventude pobre por conta da opção pelo uso de drogas. E, com a explosão das cracolândias, o internamento compulsório passou a ser usado como mais um instrumento para provocar esta exclusão. "Não compreender como se dá o fenômeno do uso de drogas e quais as melhores formas de tratar aquele indivíduo que abusa do uso pode levar, até mesmo o defensor público, a atuar como agente involuntário da exclusão", pontua.

Para Nicory, o uso de drogas está mais relacionado a fatores sociais e ambientais que psicológicos, de modo que, tirar o sujeito do ambiente onde ele faz uso das substâncias, sem fazer intervenção no local para o qual ele será devolvido não tem efeito satisfatório. Ainda falando sobre os internamentos, o defensor alertou para a necessidade de diferenciar as instituições que se propõem a tratar dependentes químicos. "Vamos diferenciar bem o que é uma unidade de internação psiquiátrica, o que é o serviço médico de saúde ambulatorial, o que é comunidade terapêutica e o que não é nada".

O Projeto de Lei 7663/2010, do deputado Osmar Terra (PMDB/RS), também foi tema de discussão na palestra. O projeto, entre outras coisas, pauta a internação involuntária como política pública. Esta medida, que atualmente só pode ser solicitada pela família, com as alterações previstas no projeto, poderia ser requerida por qualquer servidor público do sistema social de saúde.

Deliberações - A plenária final do evento decidiu pela criação de oito Grupos de Estudo Virtuais. Através deles, os defensores inscritos poderão debater questões práticas e acadêmicas acerca dos temas dos sete painéis do evento - Prevenção, Mediação e Regulamentação Fundiária e Direito à Moradia; Povos Tradicionais, Direitos Étnicos e Direitos Humanos; Pessoas com Deficiência: uma questão de acessibilidade e inclusão; Violência Doméstica; Violência Policial e Tortura; e Substâncias Psicoativas e Direitos Humanos - e População em Situação de Rua.

A criação de uma Comissão Estadual de Direitos Humanos também foi aprovada. A mesma será constituída por um representante de cada Regional, um da Região Metropolitana e um de cada área de atuação da Especializada de Direitos Humanos. A comissão se reunirá quatro vezes ao ano: duas reuniões acontecerão nas regionais, uma durante a semana do Defensor Público e uma durante as próximas edições do Encontro Baiano de Defensores em Direitos Humanos.

Outras propostas de encaminhamentos também foram feitas pela plenária. Entre elas estão: o uso do nome social de transexuais no Sistema Integrado de Gestão de Atendimento da Defensoria (SIGAD); a realização de um levantamento acerca do funcionamento dos equipamentos sociais - como CAPES, CRAS - nas cidades onde há unidade da Defensoria; e a participação da Instituição na discussão sobre a criação de alas LGBT.