COMUNICAÇÃO

Rebelião em presídio de Eunápolis expõe questão da revista vexatória

12/05/2014 19:58 | Por

Seis mortos e sete feridos. Este foi o saldo da rebelião ocorrida na manhã desta segunda-feira, 29, no Conjunto Penal de Eunápolis, no sul da Bahia, a 671 km de Salvador. Mais uma vez, volta à discussão a questão da conhecida "revista vexatória". De forma arbitrária e constrangedora, os presos daquela unidade, segundo informações, foram submetidos aos mesmos procedimentos a que os visitantes, geralmente familiares, são obrigados a passar, que incluem as partes íntimas.

Segundo relatos de presos e familiares, a principal causa da rebelião foi a forma de revista realizada por agentes penitenciários e policiais militares durante os procedimentos de rotina, obrigando-os à revista íntima. A manifestação ocorreu no Pavilhão A, que abriga 341 presos provisórios (que não têm sentença proferida pela Justiça). Durante a rebelião, três detentos foram queimados junto com os colchões e outros três mortos por arma branca. Sete pessoas ficaram feridas, inclusive PMs, atingidos por "fogo amigo".

A questão da revista vexatória vem sendo discutida em todo o país. A forma como acontece, em diferentes unidades prisionais, é uma afronta à dignidade da pessoa. Geralmente ocorre com maior constrangimento em mulheres, companheiras ou familiares de presos que são obrigadas a uma verdadeira "ginástica", a fim de comprovar que nada carregam nas partes íntimas.

A Defensoria Pública da Bahia desenvolve um projeto para a extinção da revista vexatória, com a aquisição dos body scanners pelo sistema prisional baiano. Nesse sentido, foram encaminhados ofícios à Secretaria Estadual de Administração Penitenciária e Ressocialização (SEAP) solicitando a mudança de procedimentos. São aparelhos que agem como se fosse raios x, mostrando numa tela se a pessoa carrega em seu corpo qualquer tipo de objeto. Alguns presídios, como em Minas, Paraná, Ceará e Goiás já adotam o sistema.

"Pesquisa realizada em 2011, pelo Minnesota Departament of Corrections, concluiu que o recebimento de visitas regulares reduz sensivelmente a probabilidade de reincidência dos apenados. Estudos também analisam a revista íntima sob a ótica de gênero, em dois aspectos: da visitante mulher e do encarceramento feminino. É fato que a grande maioria de visitantes é mulher, são mães, esposas e filhas que, por uma formação de cuidado e por sua afetividade melhor estimulada, persiste na ligação com seus familiares", diz um trecho do documento.

"Em São Paulo, essa discussão já está bem avançada, pois lá segmentos organizados da sociedade civil participam mais ativamente desse debate, inclusive com ONGs voltadas para a questão dos presídios, como, por exemplo, a Pastoral Penal", informa o subcoordenador da Especializada de Crime e Execução Penal da Defensoria, Alan Roque.

No mês passado, os defensores Pedro Paulo Bahia e Nelson Côrtes participaram de uma audiência pública promovida pela Defensoria Pública daquele estado. Na pauta, além dos relatos de parentes dos presos, a análise de representantes de entidades públicas e privadas, de especialistas, assim como o encaminhamento de várias propostas de ação. Todos concordam que o método de revista já deveria ter sido substituído. Houve sugestão, inclusive, de se encaminhar denúncias a fóruns de Justiça internacionais.

"Vamos agora a Goiás para conhecer como funciona o sistema de alguns presídios de lá com a implantação desses equipamentos. Mas, a partir de nossa iniciativa, podemos dizer que a SEAP tem se mostrado mais sensível a esta questão, inclusive com a possibilidade de instalar, mais imediatamente, raquetes (para detectar metais) e banquetas (também para leitura eletrônica de corpos)", comentam Bahia e Côrtes.

No entanto, essa possibilidade não afasta a instalação dos scanners, já que, embora seu preço seja bem mais alto, o nível de eficiência é proporcionalmente correspondente. Ou seja, a implantação desses equipamentos, além de tornar a fiscalização, sobre o que poderia ou não entrar nos presídios, mais eficaz e segura, evitaria, de uma vez por todas que, constrangimentos causados aos familiares dos presos, como também os atos de pura arbitrariedade e abuso de poder cometidos por agentes penitenciários e policiais.

De acordo com matéria veiculada no jornal A Tarde, "as famílias reclamam do tratamento dado aos internos. Segundo as mulheres de alguns presos, o procedimento de revista íntima ao qual são submetidas é ‘constrangedor' e ‘humilhante'. Elas contam ser obrigadas a ficar agachadas para que agentes realizem o toque anal e vaginal, a fim de verificar se objetos estão sendo transportados pelas visitantes para o interior da unidade".

A mulher de um detento ouvida pelo jornal, que, por segurança não quis ser identificada, disse "que a rebelião teria começado justamente porque agentes penitenciários e policiais estariam obrigando os presos a passar por revista íntima semelhante à realizada em visitantes".

"A instalação dos scanners pela SEAP teria várias funções, pois, ao mesmo tempo em que acabaríamos de uma vez por todas com a revista vexatória, evitaríamos a entrada de aparelhos celulares, que, em muitos casos, são utilizados pelos detentos para a prática de extorsão aqui fora. Seria maior segurança para a própria sociedade", avalia o subcoordenador Alan Roque.