COMUNICAÇÃO

Reforma do Código Penal: lógica do encarceramento continua

17/07/2012 19:07 | Por

Novo Código Penal avança em alguns temas, mas prisão continua sendo única alternativa de punição no Brasil


No final do mês passado, a Comissão Especial de Juristas composta para elaborar o projeto de reforma do Código Penal, concluiu seus debates e entregou o resultado de sete meses de trabalho ao Senado Federal. Ao longo destes meses, foram analisadas seis mil sugestões enviadas pela sociedade civil, além de diversas audiências públicas realizadas. O código atual em vigor já tem mais de 70 anos. Agora, o texto do anteprojeto será entregue ao Congresso Nacional.

Além de atualizar dispositivos ultrapassados do Código Penal brasileiro, que data de 1940, a proposta também incorpora uma série de leis sobre justiça penal, que foram promulgadas de forma autônoma ao longo das últimas décadas, e cria ainda novos tipos penais, como o bullying, o terrorismo e o enriquecimento ilícito.

De acordo com o defensor público e coordenador do Núcleo Criminal da Defensoria Pública do Estado da Bahia, Alan Roque, a tarefa da Comissão Especial de Juristas, formada por defensores públicos, advogados, membros de tribunais, consultores legislativos, professores e outros estudiosos, foi atualizar o Código Penal: “Era imprescindível uma releitura do sistema penal à luz da Constituição, tendo em vista as novas perspectivas normativas pós-88”.

Para o defensor público Daniel Nicory, o Código Penal brasileiro passou por inúmeras reformas ao longo desses setenta e dois anos. Segundo ele, toda a parte geral foi reformada em 1984, e sofreu alterações pontuais depois disso. “Mesmo a parte especial (que define os crimes e as penas), cuja base é de 1940, também passou por muitas reformulações. Então, na verdade, muitas reformas aconteceram. A questão é que a reforma de um código por inteiro é sempre uma atividade que demanda muito esforço e grande ônus político. Basta lembrarmos que o Código Civil de 1916 só foi substituído em 2002, por uma proposta que tramitava no Congresso Nacional há mais ou menos 30 anos”, destaca Nicory.

Política de aprisionamento

O anteprojeto do Código Penal manteve a estrutura baseada na política de aprisionamento em vigência no país, apesar de propor alterações importantes na relação entre o Estado e a vida privada dos cidadãos brasileiros. O novo Código aumenta, por exemplo, as penas para homicídios culposo de três para quatro anos. Também propõe punir de maneira mais rigorosa aqueles que utilizam adolescentes ou até crianças na prática de crimes.

Para o defensor público Alan Roque, a sua posição é no sentido de reduzir o alcance do campo de proibição do direito penal, seguindo a linha de pensamento que prega a utilização do sistema repressivo como última trincheira de salvação da sociedade. “A modernização do sistema legislativo penal passou pelo ponto de colocar o Código Penal como o centro do ordenamento jurídico-penal. Esse modelo otimiza o controle sobre a expansão desordenada do direito penal, assim como facilita o conhecimento do universo penal em vigor, tanto para seus operadores, como para a sociedade Essa preocupação não pode passar despercebida, visto que vivemos imersos numa avalanche de leis penais. Pune-se tudo, para tudo tem uma lei penal. Vivemos numa verdadeira 'panaceia legislativa penal', que vem acarretar num descrédito desta forma de controle social”, afirma Roque.

De acordo com a Pastoral Carcerária, a cada 10% de aumento da população prisional, o máximo de redução na criminalidade é de 4%. Em crimes como homicídio e tráfico de drogas, o efeito é praticamente zero. Medidas como mais celeridade na justiça criminal e melhor aparelhamento das polícias, segundo a entidade, surtiriam melhores resultados. Outra questão é o alto custo do encarceramento.

“Entendo oportuno repensar, dentre outras propostas de mudanças no Código Penal brasileiro, aquelas que vão na contramão do moderno Direito Penal, de cunho mais democrático e garantista”, concluiu o defensor público Alan Roque.