COMUNICAÇÃO
Roda de Conversa define iniciativas estadual e nacional em defesa dos direitos dos povos ciganos
Mais de 50 pessoas participaram do evento virtual que teve como tônica a indignação pela morte de oito ciganos da mesma família no Sudoeste do estado.
Uma audiência pública para levantamento das demandas dos povos ciganos do estado e um seminário nacional para discutir direitos e Sistema de Justiça. Esses foram os encaminhamentos da Roda de Conversa “Direito de Ser e Existir da População Negra e Povos Ciganos”, que aconteceu, de forma virtual, na tarde de terça-feira (03/08).
O evento promovido pela Ouvidoria Cidadã da Defensoria Pública da Bahia foi marcado pelos sentimentos de tristeza e indignação pela morte de oitos ciganos integrantes de uma mesma família no Sudoeste Baiano. O caso teve início no dia 13 de julho, quando dois policiais foram mortos no Distrito de José Gonçalves, na zona rural de Vitória da Conquista.
Para a presidente da Associação Nacional das Mulheres Ciganas, Dinha Vieiras, o caso é uma demonstração de que as políticas públicas não chegaram para os povos ciganos. “Se eles fizeram algo de errado, têm que pagar, mas dentro da Lei, pois no Brasil não temos pena de morte”, ressaltou. Ela também contestou a versão apresentada pela polícia de que as mortes teriam ocorrido em confrontos. “Não entra no meu entendimento como foi esse confronto que não teve prisões, só mortes”.
As declarações de Vieiras foram endossadas pela deputada estadual Olívia Santana, ao lembrar que “para alguns públicos, a pena de morte é um fato”, já que muitas pessoas negras morrem por serem identificadas como suspeitas. Ao se referir ao ocorrido no Sudoeste do estado, a também presidente da Comissão dos Direitos da Mulher da ALBA classificou o caso como “barbárie”.
De acordo com o representante dos povos ciganos, Diran Reis, as mortes são apenas uma dimensão das violências sofridas pela comunidade cigana da região. Segundo ele, há relatos de pessoas que estão passando fome em suas casas com medo de represálias. “Eles têm dinheiro para comprar alimento, mas não querem sair de casa por medo”, relatou.
Reis também lembrou outras violências contra a comunidade cigana no estado, a exemplo dos sequestros ocorridos em Camaçari e Ilhéus. Em agosto de 2017, pelo menos sete ciganos foram sequestrados entre o Sul e o Sudoeste da Bahia. De acordo com os relatos da época, os crimes eram cometidos por quadrilha especializada no sequestro de ciganos que possuíam joias, carros e dinheiro. No início desse ano, também foram registrados cinco sequestros e três assaltos às famílias ciganas de Camaçari e região.
Ainda durante o evento, foi destacada a necessidade de investigação e esclarecimento dos fatos que resultaram nas mortes e nas demais violências. Esse, inclusive, foi um compromisso assumido pelo comandante do Policiamento Regional Sudoeste, Ivanildo da Silva. Ele informou que os excessos estão sendo apurados e se colocou à disposição das lideranças ciganas para auxiliar na liberação dos corpos e assim possibilitar que os familiares realizem o sepultamento.
O caso já é acompanhado pela Defensoria Pública, que além de se reunir com o Comando de Policiamento do Sudoeste para esclarecer as denúncias de perseguição contra a comunidade cigana, garantiu o deslocamento de cinco mulheres e sete crianças da família para o município de Jequié e, como solução definitiva, busca a inserção dessas pessoas em um programa de proteção a testemunhas.
Encaminhamentos
Buscando atender ao objetivo do evento, que era de criar uma articulação a nível nacional e estadual pela defesa do direito à vida, foram assumidos dois compromissos pela Ouvidoria da DPE. O primeiro, em nível local, foi a realização de uma audiência pública para escuta das demandas dos povos ciganos no estado e definição dos encaminhamentos que podem ser feitos a partir da mediação da Ouvidoria.
“Além dessa fatalidade que aconteceu em Vitória da Conquista, eu quero abrir uma frente dentro da Defensoria para atender à população cigana e, para isso, eu preciso conversar com as lideranças”, informou a ouvidora-geral, Sirlene Assis. O evento deverá contar com a presença de defensores e defensoras públicas e a data de realização será definida junto com os representantes dos movimentos ciganos que estiveram presentes na Roda de Conversa.
Em nível nacional, foi assumido o compromisso de realizar um seminário para discutir os direitos da população cigana e o Sistema de Justiça. “Será um grande evento para discutir esse lugar que, muitas vezes, não conseguimos acessar como comunidade, como povos ciganos”, explicou a ouvidora.
Estiveram presentes no evento a subdefensora-geral, Firmiane Venâncio, os defensores públicos Clériston Macêdo, Maurício Saporito, José Raimundo Campos e Rafael Couto; a defensora pública Yana de Araújo Melo; o deputado Hilton Coelho; o superintendente de Direitos Humanos (SJDHDS), Jones Carvalho; o assessor Especial da SEPROMI Ailton Ferreira; o presidente Estadual UNEGRO-BA Eldon Neves; a presidente da Associação Estadual das Etnias Ciganas de Mato Grosso, Fernanda Caiado; o cigano e professor da UEFS Jucelho da Cruz; a membra do Conselho Pastoral dos Pescadores e Coalizão Negra por Direitos, Zezé Pacheco; o ouvidor da Defensoria do Rio de Janeiro e Coordenador de Política Criminal do Conselho Nacional das Ouvidorias Externas das Defensorias do Brasil, Guilherme Pimentel; o vice-presidente do Instituto dos Cigano do Brasil, Paulo Cigano; e o vice-procurador geral da República, Luciano Mariz Maia.