COMUNICAÇÃO
Serviço de mediação da Defensoria reduz tempo para resolução de conflitos familiares na Bahia
De janeiro a setembro desse ano, mais de 11 mil casos já foram atendidos pelo Núcleo de Mediação Familiar da Defensoria Pública
Maria dos Santos, moradora de Bom Jesus dos Passos, ilha localizada a 20 km de Salvador, está separada do marido há 28 anos. Com quatro filhos e sem condições de pagar um advogado, a dona de casa deixou que o tempo passasse e, mesmo sem ver o ex-companheiro há quase três décadas, legalmente, permanece casada. Já A.B.M. quer entrar com um pedido de pensão. Vivendo juntos há 15 anos, embora separada há três anos do marido, a dona de casa entendia ser justo o pagamento da pensão - mesmo vivendo sob o mesmo teto. As histórias são diferentes, mas, trazem consigo algo em comum: elas contaram com o atendimento do Núcleo de Mediação Familiar da Defensoria Pública da Bahia e tiveram seus problemas resolvidos sem precisar recorrer à Justiça.
Todos os dias, milhares de brasileiros procuram a Justiça para reivindicarem seus direitos. São pessoas que, lesadas ou ameaçadas, chegam ao Poder Judiciário em busca de uma solução, na maioria das vezes imediata, para seus problemas. No entanto, a quantidade de processos abertos ou distribuídos não é igual ao número de ações julgadas. Atualmente, milhares de processos judiciais na área de família estão parados em 14 varas à espera de decisões dos juízes.
O que muitas pessoas não sabem é que, antes de a disputa virar mais um processo judicial, é possível chegar a um entendimento entre as partes e resolver o problema de forma alternativa, eficaz e rápida, por meio de soluções extrajudiciais - mecanismos alternativos que têm o objetivo de buscar um acordo entre as partes, sem que seja necessária a intervenção jurisdicional.
Criado em setembro de 2010, o Núcleo de Mediação Familiar da Defensoria Pública da Bahia tem o objetivo de resolver conflitos ligados à área de família, orientando as partes a encontrarem soluções possíveis e convenientes para ambos. Casos de disputas como divórcio, pensão alimentícia, reconhecimento e dissolução de união estável, revisional de alimentos, conversão de separação em divórcio, guarda, visita, entre outros, são atendidos, diariamente, na unidade da Defensoria, localizada na Casa de Justiça e Cidadania, Shopping Baixa dos Sapateiros. Desde julho, o Núcleo também já conta com serviços como ação de interdição e ação de alimentos para filhos menores quando não há possibilidade de acordo. Nesse caso, não há sequer agendamento e os assistidos são atendidos no mesmo dia.
A defensora pública Tatiane Franklin, responsável pelo Núcleo, explica que a função principal da mediação é a possibilidade de resolução do conflito sem a necessidade de judicialização. Ou seja, as partes terão a oportunidade de, juntas, solucionarem o conflito familiar. Segundo Tatiane, o diferencial do serviço é que, através de uma equipe multidisciplinar formada por mediadores, psicólogos e assistentes sociais, tenta-se resolver não apenas o problema jurídico, mas também o relacional. "É importante que evitemos um desgaste desnecessário às partes. Ao optar pela mediação, evita-se um processo mais demorado e doloroso", afirma. O tempo médio para resolução dos casos é de 30 dias. Na Justiça, os processos durariam anos.
"Como o Poder Judiciário não vem solucionado os conflitos que lhe são postos em tempo razoável, a Defensoria Pública entendeu ser necessário incentivar a prática da mediação, principalmente na área de família, vez que é imprescindível empoderar o cidadão, despertando-lhe a consciência de que ele é a pessoa mais apta para encontrar a melhor solução para o seu conflito", pontua a defensora.
Tatiane Franklin lembra ainda que os instrumentos da conciliação e da mediação são eficazes em outras áreas do Direito. "Podemos destacar demandas de consumo (causas contra instituições bancárias e grandes fornecedores, demandas contra operadoras de plano de saúde) e questões possessórias".
ATENDIMENTO
Para ser atendido, o assistido pode procurar a unidade da Defensoria de segunda à sexta-feira, das 8h30 às 16h30. Após passarem por uma triagem, os casos identificados como passíveis de mediação são avaliados e verifica-se com a parte se há interesse em tentar resolver o conflito a partir de um acordo. Nestes casos, uma carta convite será encaminhada à outra parte para que compareça ao Núcleo e a primeira sessão de mediação seja marcada. O encontro pode acontecer já no dia seguinte e, em alguns casos, apenas uma sessão de mediação é suficiente para que o acordo seja firmado.
Após entendimento entre as partes, o pedido de homologação com as medidas pactuadas é ajuizado em uma unidade do Tribunal de Justiça localizada no próprio NAJ. Processos que levariam anos para serem julgados na Justiça comum, por meio da mediação, são concluídos em cerca de 30 dias. No entanto, mesmo se depois das sessões de mediação o casal não chegar a um acordo, em ações como divórcio, por exemplo, o Núcleo formaliza uma ação litigiosa e o processo terá início em uma das Varas de Família.
RG, CPF, certidão de casamento e/ou dos filhos, comprovante de residência são alguns dos documentos necessários ao atendimento. Quem tiver dúvida, pode ligar também para o Disque Defensoria - 129 (telefone fixo).
RECOMEÇO
Também no Núcleo, é possível participar de oficinas educativas - sobre alienação parental, por exemplo. Em alguns casos, o que começou como uma ação de divórcio acaba se transformando em um recomeço para o casal.
Não foi o caso de Maria dos Santos. Levada pela cunhada ao Núcleo de Mediação, a moradora de Bom Jesus dos Passos finalmente deu entrada no divórcio. O marido nem precisou sair do Maranhão, onde vive atualmente. Bastou apenas a presença da irmã dele, que serviu como procuradora legal e os papéis foram assinados. Com a homologação do acordo celebrado entre as partes, assinado por uma juíza que atua no próprio NAJ, a próxima etapa será a de voltar ao cartório onde o casamento foi feito e, finalmente, retirar uma nova certidão. Maria passará a ser, legalmente, divorciada - o que lhe deixa bem mais confortável, já que, atualmente, a dona de casa possui outro companheiro. Casar novamente? "Nem pensar", despistou.
A.B.M por sua vez, descobriu que, legalmente, o marido, que ainda mora com ela e mantém as despesas da residência onde vivem juntos, não é obrigado a destinar qualquer valor a título de pensão alimentícia para a dona de casa. Resolveram, contudo, de forma amigável, que já era hora de separarem-se definitivamente. Ele sairá de casa.
PROCESSOS
Daniela Azevedo, defensora pública que atuou no Núcleo durante três anos, chama atenção ainda para o que chama de "cultura do diálogo". "A mediação não é a única medida alternativa à resolução do conflito, mas, talvez, seja a alternativa mais assertiva, por priorizar um atendimento humanizado, facilitando o entendimento entre as partes. Evitamos com isso a abertura de mais um processo que, na maioria das vezes, levaria muito mais tempo para ser resolvido e fortalecemos a cultura do diálogo", esclareceu. Segundo Azevedo, 95% dos casos atendidos são resolvidos na própria unidade, sem a necessidade da abertura de processos judiciais.
Além de participar das mediações, a equipe realiza também um trabalho de acompanhamento domiciliar. O objetivo é verificar se a situação apresentada pelas partes durante os encontros corresponde à realidade, ou, ainda, se os acordos definidos durante as mediações têm sido cumpridos. Para isso, psicólogos e assistentes sociais visitam as residências e, além de entrevistarem in loco as partes envolvidas, conversam com parentes, amigos e vizinhos. "Temos o cuidado de fazer não apenas o acompanhamento dos casos, mas, também, alguns encaminhamentos a uma rede de atenção e proteção às pessoas que envolvem CRAS, CREAS, unidades de saúde (há casos aonde o assistido chega com um quadro de depressão), entre outras", pontuou a psicóloga do Núcleo, Lílian Ferreira.
MEDIAÇÃO PODE VIRAR LEI
Na última terça-feira (1º), o Ministério da Justiça entregou ao Senado Projeto de Lei sobre Mediação. A ideia é tornar o mecanismo obrigatório para as causas que tratam de direitos disponíveis, como patrimônio e contratos. Segundo o projeto, assim que ocorrer o ajuizamento da ação, ela seguirá direto para o setor de mediação, que terá três meses para tentar resolver o litígio.
NÚMEROS
Em 2012, 11.195 atendimentos foram realizados pelo Núcleo de Mediação, envolvendo 4.480 atendimentos jurídicos, 1.030 mediações realizadas, 770 acordos homologados, entre outras ações. De janeiro a setembro deste ano, o número de casos atendidos pela Defensoria já chegou a 11.362. A prática desenvolvida pela instituição já foi reconhecida nacionalmente como destaque pelo Conselho Nacional de Justiça - CNJ por meio do Movimento Pela Conciliação, em 2011.
SERVIÇO
O quê: Mediação de conflitos familiares;
Onde: Núcleo de Mediação da Defensoria Pública, localizado à rua J.J. Seabra, s/n, 2º andar do Shopping Baixa dos Sapateiros;
Quando: Atendimento de segunda à sexta-feira, das 8h30 às 16h30.