COMUNICAÇÃO

Subnotificação de torturas durante prisões em flagrante atinge 84% na pandemia, mostra pesquisa da Defensoria

10/12/2021 17:00 | Por Lucas Cunha - DRT/BA 2944

Dado faz parte de relatório lançado de forma virtual nesta sexta, 10, e produzido a partir das audiências de custódia; percentual aumentou 40% em relação ao levantamento de 2019

A suspensão das audiências de custódia na pandemia no ano passado provocou uma subnotificação de 84% nos relatos de tortura e maus tratos durante a prisão em flagrante em Salvador. Este é um dos dados apresentados no relatório Autos de Prisão em Flagrante na Comarca de Salvador (ano 2020), lançado de forma virtual pela Defensoria Pública do Estado da Bahia – DPE/BA, nesta sexta (10), por suas redes sociais.

Se no ano anterior (2019) foi constatado uma subnotificação de 45,23% de coleta de dados sobre ocorrências de lesões durante as prisões em flagrante, no relatório produzido em 2020 houve uma ausência destes dados em 84,73% dos casos, um aumento de quase 40%.

Durante a apresentação, a assessora de pesquisas estratégicas da DPE/BA, Fernanda Morais explicou que a audiência de custódia é um ato processual que consiste no direito que a pessoa presa em flagrante tem de ser levada à presença de um juiz para verificar se: ela sofreu algum tipo de tortura ou de maus-tratos quando da prisão em flagrante; se aquela prisão em flagrante deve ser convertida em prisão preventiva; ou ainda se a pessoa deve ser colocada em liberdade ou se aquele flagrante foi irregular.

“As medidas de distanciamento recomendadas pela Organização Mundial de Saúde tiveram impacto significativo sobre a rotina e os expedientes do sistema de justiça criminal, notadamente por conta da suspensão das audiências presenciais, e, dentre elas, das próprias audiências de custódia. Como resultado dessa suspensão, percebe-se um aumento de mais de 40% nos índices de subnotificação de tortura e maus tratos ocorridos durante a prisão em flagrante”, analisou a defensora pública Fernanda Morais.

Perfil dos presos

Responsável por apresentar os dados do relatório no lançamento, o coordenador da Especializada Criminal e de Execução Penal da DPE/BA; Pedro Casali Bahia, destacou o perfil médio das pessoas presas em Salvador: homem (95%), negro (98%), jovem (68,8% tem entre 18 e 29 anos), ensino fundamental incompleto (34,3%) e que tem uma renda mensal abaixo de dois salários mínimos (83,9%).

“Não se pode dizer que essa proporção é justa em Salvador, porque, segundo o IBGE, nós temos na capital uma população de 82% negra, enquanto o relatório mostra que esse número nas audiências de custódia é de 98%. É preciso entender a origem desses dados, quais são as causas e entender as consequências. Os dados apresentados pelo relatório da Defensoria são um poderoso instrumento para a sociedade”, analisou Pedro Casali.

Também presente na mesa do lançamento do relatório, o defensor público Rafael Couto comentou que os dados apresentados revelam a realidade racista do sistema prisional, a partir de dados empíricos que demonstram quem são os presos em flagrante em Salvador. 

“Salvador é a maior cidade negra fora do continente africano, mas esse percentual não é proporcional com os números da população. É aquilo que o professor Silvio Almeida chama de racismo estrutural. A sociedade brasileira foi construída com base na escravidão do povo negro. Os dados do relatório, mostrando que 98% das pessoas presas em Salvador são negras, apenas reflete que nada mudou nesse sistema, demonstra o discurso punitivista estatal”, afirmou Rafael Couto.

O relatório Autos de Prisão em Flagrante na Comarca de Salvador (ano 2020) pode ser acessado aqui.

Veja como foi transmissão do lançamento: