COMUNICAÇÃO
VOZES POP RUA – Após 35 anos em situação de rua, Luiz Gonzaga tornou-se cofundador do MNPR e passou a lutar pelos direitos dessa população
Um dos fundadores do MNPR na Bahia, Luiz Gonzaga é entrevistado nesta edição da série Vozes Pop Rua
As poucas palavras não escondem a experiência de quem viveu entre a população em situação de rua por 35 anos. O entrevistado da série Vozes Pop Rua desta semana é Luiz Gonzaga Alves de Jesus – que aos 61 anos descreve com orgulho sua história de vida e o quão importante ela é para o trabalho que realiza diariamente – de ajudar outras pessoas que vivem na mesma situação.
Luiz Gonzaga saiu de casa aos 13 anos, no interior da Bahia, mudou-se para São Paulo onde viveu em situação de rua. Após realizar um curso profissionalizante, de volta a Salvador, foi convidado para fundar o Movimento Nacional População em Situação de Rua no estado da Bahia – o MNPR e foi neste momento em que a sua vida ganhou um novo significado. Atualmente, Gonzaga busca viabilizar o acesso às políticas públicas para pessoas em situação de vulnerabilidade.
Você já teve vivência como pessoa em situação de rua. O que provocou isso?
Sim, já vivenciei. Na minha infância, eu me envolvi com álcool em meu ambiente familiar. Por isso, aos 13 anos de idade, saí de casa, no interior da Bahia, e fui para a cidade de São Paulo, onde passei a morar na rua.
Por quanto tempo você ficou na rua e quais foram as dificuldades enfrentadas?
Estive durante 35 anos em situação de rua. As dificuldades que enfrentei foram desde o início, onde tive que me virar desde criança nesse mundo novo para mim. Várias foram as dificuldades, entre elas: a fome, insegurança, preconceito, conflitos, medo e o distanciamento da família.
Você recebeu apoio de alguém ou de algum órgão público neste período? Que tipo de apoio encontrou?
No início, não. Mas em certo tempo que estava em situação de rua, tive oportunidade de ser convidado para fazer um curso profissionalizante no SENAI, no bairro Bom Retiro, na cidade de São Paulo. Fiz um curso de pintor industrial. Ali, não somente aprendi uma profissão, mas pude trocar experiência de vida com outras pessoas.
Como você conseguiu sair da situação de rua?
Eu conseguir sair por meio do curso que fiz no SENAI. Saí de São Paulo e vim para Salvador, mas continuei morando na rua. Tinha uma barraca no Largo de Roma, foi ali onde conheci Maria Lúcia, que me perguntou se topava fundar um movimento de população de rua. Ela conseguiu para mim uma vaga de acolhimento na Igreja da Ordem Terceira da Santíssima Trindade.
Hoje, você desenvolve ou faz parte de alguma iniciativa voltada para ajudar pessoas que vivenciam a mesma experiência de não ter uma moradia? Caso sim, poderia contar mais sobre isso?
Eu, Luiz Gonzaga Alves de Jesus, junto com a falecida Maria Lúcia, fundamos o Movimento Nacional da População de Rua – MNPR no estado da Bahia. Fomos juntos à cidade de Cajamar, em São Paulo, e registramos esse movimento social no ano de 2010. O MNPR, no estado da Bahia, vem lutando para garantir o acesso às políticas públicas sociais voltadas às pessoas em situação de vulnerabilidade – nesse caso, às pessoas em situação de rua. Reivindicamos a saúde, moradia, emprego, renda, direitos de sermos vistos como cidadãos e o exercício da cidadania.
Quais têm sido os principais desafios enfrentados pela população de rua durante esse período de pandemia, em sua opinião?
Os principais desafios têm sido o acesso às informações, preconceito, acessar as políticas públicas sociais e suas garantias, receber acolhimento, alimentação, saúde e sofrer com a violência.
No seu caso, houve algum momento particular que foi mais difícil ou desafiador? Como essa questão foi solucionada, quais apoios você encontrou?
Sim. Eu construí uma família em situação de rua. A barraca em que eu morava com minha família pegou fogo e a minha primeira filha estava com três dias de nascida. A pessoa em situação de rua somente tem a sua questão solucionada quando o que lhe falta passa a ser garantido – no meu caso, por exemplo, a questão era uma moradia. Isso não foi adquirido em seguida. Sendo assim, eu tive que seguir em frente com a minha família e construir uma nova barraca. Quanto aos apoios encontrados, eles vieram de pessoas próximas, igrejas, acolhimento e, aqui na Bahia, pude receber ajuda na Igreja da Ordem Terceira da Santíssima Trindade e dos representantes da Pastoral de Rua.
Confira outras entrevistas da série Vozes Pop Rua